Política

Depois de Lula um vazio de futuro na política brasileira

O analista é um candidato à terapia intensiva


Reprodução Depois de Lula um vazio de futuro na política brasileira
Rudá Ricci

Por Rudá Ricci, sociólogo, no facebook  

1. A saúde de Lula antecipa o processo de sucessão no campo lulista para evitar um "efeito Biden" em que o etarismo ganha ares de julgamento 

2. Neste campo, Haddad força  - como é do seu estilo - seu nome como natural sucessor, com o beneplácito de parte da Faria Lima e Globonews. O problema é que é o mais liberal dos petistas e só venceu uma eleição municipal,  com ajuda decisiva de Lula. Os acordos feitos para sua eleição foram traídos por ele, segundo lideranças sociais da Zona Leste. Resultado: não se reelegeu.

3. No campo do centro-esquerda, Boulos seria o nome mais certo. Vinha numa ascensão política de alta visibilidade com perfil aproximado do de Lula, mas mantendo independência mais à esquerda. 

4. Contudo, o primeiro turno das eleições municipais de São Paulo deste ano desmontaram seu perfil. Boulos parecia uma gelatina sem sabor: não conseguiu manter uma forma estável. Virou um "Freixo Paulistano": aumentou os votos na classe média intelectualizada e perdeu feio nas periferias (seu habitat político). O lulismo fez mais uma vítima 

5. Na extrema-direita, o impacto do desmonte e caça ao bolsonarismo deixam este campo atordoado. Se o ciclo dos outsiders parece terminado, agora, o ciclo bolsonarista também parece incerto de continuar. O que abre uma temporada de cotoveladas para entrar na fila pelo espólio 

6. Marçal e Eduardo Bolsonaro seriam nomes fáceis, mas, ainda sem consistência eleitoral e enraizamento orgânico. Mobilizam, mas ainda não organizam.

7. Michelle Bolsonaro parece ter perdido fôlego, assim como toda ala feminina do bolsonarismo,  com destaque para a sniper Carla Zambelli 

8. O bloco Gzuis, tendo Nikolas Ferreira à frente é uma promessa. Dificilmente provará a que veio antes de 2030.

9. Finalmente,  o Centrão, ou a direita sapatênis. Embora queira fazer parte deste clube, Tarcísio percebeu que sua PM o detonou - até aqui - como político moderado. Além de enfrentar um início de revolta na sua base política contra seu "primeiro-ministro" Gilberto Kassab. 

10. O Centrão, ou direita que não quer dizer seu nome, herda o estilo PMDB: tem força regional, mas não consegue impor um nome nacional. É como se as forças regionais se equivalessem e não endossassem um príncipe maior. Preferem se dividir no apoio à um presidenciável mais à direita ou esquerda para poder chantageá-lo até sobrar algumas de suas peças de roupa

11. Ciro Nogueira já caiu fora do barco bolsonarista, Arthur Lira sabe que o seu café esfriou, Pacheco insinua abandonar a política e  sobra ao Centrão o puro sumo do baixo-clero.

12. Vivemos, portanto, um "vazio de futuro" na política nacional. Um interregno que, imagino, durará de 2 a 6 anos. Uma janela para a renovação de lideranças e expoentes políticos ou de reciclagem dos não novatos

13. Qual seria o perfil das novas lideranças nacionais? Arrisco dizer que não será moderado, alguém morno ou sem sal. O Brasil é profundamente desigual e ressentido. Não há muito espaço para estilo gentleman

14. Imagino que um perfil mais agressivo, com toques de carisma e demagogia, com forte inserção nas redes sociais teria espaço junto à massa do eleitorado. 

15. O marketing deve continuar em alta, dado que nunca na minha vida percebi uma sociedade civil tão fragmentada e desmobilizada como agora. No máximo, faz eventos bissextos que não completam seu ciclo e não acumulam politicamente

16. Então, viveremos um período de gladiadores solos, cercados de grupelhos e coletivos, embalsamados por marqueteiros e "especialistas" em redes sociais

17. Não será monótono, teremos cadeiras sendo atiradas, bolinhas de papel e dancinhas em público. Um ou outro blefe, um arroubo aqui ou ali, enquanto a chantagem correrá solta nos bastidores.

18. Isso tudo se não surgir um raio em céu azul. Porque política não é algo tão previsível. Muito menos no Brasil. Já tivemos suicídio que mudou completamente o julgamento popular, tivemos liderança presa que voltou ao poder ou mobilização de massa que durou um único mês e quase enterrou todo sistema partidário

19. Alguém já disse que o Brasil não é para amadores, mas que Deus é brasileiro. As duas máximas não se excluem. O que faz de um analista um candidato à terapia intensiva. Que 2025 seja generoso.

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