Ciro Nogueira é o nome no centro da crise das bets e da injustiça tributária
Jatinho, apostas e recuo da CPI: como Ciro Nogueira travou a verdade sobre o Jogo do Tigrinho

A crise política que se intensificou nos últimos dias, marcada pela revolta popular contra o Congresso e a cobrança por justiça tributária, tem um protagonista cada vez mais visado: o senador Ciro Nogueira (PP-PI). Em meio a denúncias de favorecimento a empresários bilionários do setor de apostas e à articulação para derrubar medidas do governo que buscavam ampliar a arrecadação sobre operações financeiras, o ex-ministro de Jair Bolsonaro se consolidou como um dos símbolos da aliança entre interesses privados e decisões parlamentares.
A ofensiva do Congresso contra o decreto presidencial que aumentava o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) — imposto que recai sobre aplicações financeiras, seguros e câmbio — provocou reação imediata nas redes, que passaram a classificar deputados e senadores como defensores dos “BBB”: bilionários, bancos e bets. A articulação para revogar o aumento do imposto contou com apoio explícito do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). Mas nos bastidores, o nome de Ciro Nogueira surge como peça-chave, especialmente no que diz respeito à blindagem do setor de apostas online.
Relação com o “rei do Tigrinho”
Ciro Nogueira é apontado como um dos principais aliados do empresário Fernando Oliveira Lima, o “Fernandin OIG”, dono de casas de apostas e responsável pela disseminação do jogo “Fortune Tiger”, mais conhecido como “jogo do tigrinho”. A relação entre os dois, revelada em reportagem da revista Piauí, inclui uma viagem de Ciro à Europa a bordo de jatinho privado de Fernandin, além de transações imobiliárias suspeitas envolvendo a empresa Ciro Nogueira Agropecuária e Imóveis, da qual o senador é sócio.
Segundo relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), Fernandin adquiriu três imóveis em edifício construído pela empresa da família de Ciro, o que levanta suspeitas de conflito de interesses. O senador, por sua vez, disse desconhecer a negociação e atribuiu a gestão do negócio a seus irmãos. Ambos os irmãos já atuaram como seus assessores parlamentares.
Outro elo entre o senador e o empresário investigado é Victor Linhares de Paiva, ex-assessor de Ciro e atual secretário do prefeito de Teresina, Silvio Mendes (União). Entre dezembro de 2023 e setembro de 2024, Victor recebeu R$ 625 mil de Fernandin. O senador alegou que o valor seria relativo à venda de um relógio de luxo. Ainda segundo a reportagem, Victor teria repassado mais de R$ 30 mil ao próprio Ciro, o qual justificou como “reembolso” de uma hospedagem na Ilha de Capri, na Itália.
CPI enfraquecida, relatório ignorado
As conexões entre Ciro e Fernandin foram tema da CPI das Bets, instalada no Senado no fim de 2024 para investigar fraudes e irregularidades no mercado de apostas. Ciro Nogueira, mesmo sendo suplente, atuou diretamente nas sessões em que o empresário foi citado. Chegou a defender publicamente Fernandin, o descrevendo como “grande empresário” do Piauí. Quando a relatora da CPI, senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), propôs sua retirada da comissão para preservar a credibilidade dos trabalhos, Ciro resistiu e permaneceu como membro da CPI até seu encerramento.
Soraya, que relatou ameaças veladas e reforçou sua segurança pessoal, decidiu não incluir a íntegra dos documentos do Coaf no relatório final. Segundo ela, a omissão foi uma medida de proteção diante da escalada de intimidações. Mesmo assim, recomendou o indiciamento de Fernandin por suspeitas de lavagem de dinheiro e associação criminosa.
O relatório final, no entanto, foi rejeitado por 4 votos a 3 no Senado — uma derrota incomum para uma CPI. Entre os que votaram contra estão senadores ligados ao Centrão, como Angelo Coronel (PSD-BA), Efraim Filho (União-PB), Professora Dorinha (União-TO) e Eduardo Gomes (PL-TO), todos com vínculos políticos semelhantes aos de Ciro. O resultado evidenciou a blindagem política ao setor de apostas, enquanto o patrimônio de Fernandin disparava de R$ 36 milhões em 2022 para R$ 143 milhões em 2023.
Símbolo de uma elite blindada
A figura de Ciro Nogueira simboliza hoje não apenas a fusão entre política e interesses empresariais, mas também o esvaziamento de mecanismos de controle e transparência dentro do Congresso. Enquanto o povo clama por justiça tributária e responsabilização dos que lucram com o endividamento da população mais pobre, o senador do Piauí permanece no centro das articulações que enfraquecem fiscalizações e atacam medidas do Executivo voltadas à redistribuição de renda.
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