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Bolsonaro e aliados no banco dos réus

STF inicia interrogatórios de Bolsonaro e aliados por tentativa de golpe após eleições de 2022


Reprodução Bolsonaro e aliados no banco dos réus
Bolsonaro e aliados no banco dos réus

O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta segunda-feira (9) a fase de interrogatórios dos oito réus acusados de arquitetar uma tentativa de golpe de Estado com o objetivo de manter Jair Bolsonaro no poder após a derrota nas eleições de 2022. Pela primeira vez, o ex-presidente enfrenta o ministro Alexandre de Moraes no banco dos réus da Corte, num julgamento que promete marcar a história da democracia brasileira.

Ao lado de Bolsonaro, são réus no processo sete figuras do alto escalão do antigo governo e das Forças Armadas: Walter Braga Netto, Mauro Cid, Augusto Heleno, Anderson Torres, Paulo Sérgio Nogueira, Almir Garnier e Alexandre Ramagem. Todos são acusados de participação direta ou indireta na suposta conspiração golpista denunciada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

A sessão ocorre na sala da Primeira Turma do STF, adaptada para funcionar como um tribunal do júri, com transmissão ao vivo pela TV Justiça e um rígido esquema de segurança. Bolsonaro, acompanhado de seus ex-assessores mais próximos, compareceu presencialmente. Apenas o general Walter Braga Netto participa por videoconferência, em razão de sua prisão preventiva.

Réus de alta patente e acusações graves

As acusações variam entre os réus, mas sete deles (todos exceto Ramagem) respondem a cinco crimes: tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado – os dois últimos associados à invasão das sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023.

O general Braga Netto é apontado como o principal articulador militar do plano, enquanto Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tornou-se delator após acordo de colaboração premiada. Em seus depoimentos, admitiu envolvimento e implicou diretamente o ex-presidente e outros aliados.

Outros nomes de peso também estão no centro das investigações: o general Augusto Heleno é acusado de integrar o núcleo político-militar da trama; o ex-ministro da Justiça Anderson Torres responde por omissão e por guardar a chamada “minuta do golpe”; e o general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, é investigado por incentivar questionamentos às urnas eletrônicas e apoiar manifestações antidemocráticas.

O almirante Almir Garnier, por sua vez, é apontado como o único comandante militar que teria oferecido apoio ativo ao plano. Já Alexandre Ramagem, hoje deputado federal, responde por três crimes – todos anteriores ao início de seu mandato – e teve parte da ação penal suspensa pela Câmara.

Bolsonaro nega golpe e fala em perseguição

Jair Bolsonaro tem adotado uma postura pública ambígua: desafia a acusação, mas evita confronto direto com os ministros do STF. Nos dias que antecederam seu depoimento, afirmou estar “disposto a esclarecer tudo” e considerou positiva a transmissão ao vivo do julgamento. “Estou muito feliz de termos a oportunidade de falar sobre golpe de Estado ao vivo”, disse.

Nos bastidores, no entanto, Bolsonaro intensificou o preparo com sua equipe jurídica, reunindo-se durante o fim de semana na residência oficial do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. A defesa aposta em uma linha técnica e tenta minimizar o impacto das delações.

Seus aliados políticos atuam em duas frentes: no discurso, denunciam o que chamam de “perseguição” por parte do Judiciário; no Congresso, articulam a aprovação de um projeto de anistia que isente os acusados de punições relacionadas aos atos de 2022 e à tentativa de golpe. O projeto tem apoio de parlamentares bolsonaristas e da cúpula do PL.

“Essa denúncia se baseia em presunções e delações frágeis”, afirmou o deputado Sanderson (PL-RS), enquanto o líder da oposição na Câmara, Zucco (PL-RS), classificou o processo como “sem evidências concretas”.

Cid vira alvo da ala radical

A delação de Mauro Cid gerou reações inflamadas entre apoiadores mais radicais de Bolsonaro. Influenciadores bolsonaristas o acusam de traição e alegam que foi coagido a colaborar com a Justiça – o que é negado pelo próprio Cid e pelo STF. Embora evite ataques diretos ao ex-ajudante de ordens, Bolsonaro já insinuou que ele “pode ter cedido a pressões”.

A defesa do ex-presidente tenta neutralizar os efeitos da delação, pedindo novas oitivas de Cid. Nos interrogatórios, o militar voltou a confirmar que Bolsonaro tinha conhecimento e envolvimento no planejamento de medidas golpistas.

Julgamento histórico e expectativa de desfecho em 2025

A fase de interrogatórios marca um momento decisivo no processo. Após os depoimentos, a PGR e as defesas apresentarão suas alegações finais. A previsão é de que o julgamento ocorra ainda em 2025. A ação tramita na Primeira Turma do STF, composta por cinco ministros. Embora caibam recursos, a decisão poderá ser definitiva em primeira instância.

Se condenados por todos os crimes, os réus podem pegar até 40 anos de prisão. As acusações mais graves – como tentativa de golpe e abolição violenta do Estado Democrático de Direito – não são passíveis de indulto ou anistia presidencial.

Uma condenação robusta consolidaria a inelegibilidade de Bolsonaro, já impedido de concorrer até 2030 por decisão do TSE. Mesmo assim, a base bolsonarista trabalha nos bastidores para aprovar uma lei de anistia ampla, que poderia reverter sua condição jurídica.

Até o momento, não houve protestos significativos nas ruas nem mobilizações em Brasília. O governo Lula tem evitado se pronunciar diretamente sobre o caso, limitando-se a afirmar que “ninguém está acima da lei”.

O julgamento é o primeiro na história do país em que um ex-presidente é formalmente acusado de tentativa de golpe de Estado. Independentemente do resultado, o caso representa um marco na relação entre política, Forças Armadas e instituições democráticas no Brasil.

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