Bolsonaro 'abraça' vacina de olho em Lula, não nos mortos de covid
Ele disse ontem que nunca foi negacionista, nem contra vacinas, após ser sistematicamente negacionista e contra vacinas

Por Leonardo Sakamoto, jornalista, no Facebook
O presidente da República disse, nesta quarta (10) que nunca foi negacionista, nem contra vacinas, após ser sistematicamente negacionista e contra vacinas.
"Se você virar um jacaré, é problema de você", disse Bolsonaro sobre tomar vacina no ano passado, lembra?
E veja só: ele usou máscara em um evento, equipamento que recentemente atacou.
A razão da mudança no comportamento de Jair não foi o Brasil ter registrado, pela primeira vez, mais de duas mil mortes por covid-19 em apenas 24 horas. Para ser mais exato: 2.349. Mas o fato de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter criticado duramente o comportamento do governo dele durante a pandemia, em discurso na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, também nesta quarta.
Lula defendeu a vacina, pedindo para que os brasileiros tomem o imunizante, independente de quem seja o fabricante. E afirmou: "Não siga nenhuma decisão imbecil do presidente da República ou do ministro da Saúde. Tome vacina".
A tentativa tardia de reposicionamento de marca do presidente da República não ocorreu por conta da percepção de que estamos vivendo uma tragédia sem precedentes e que ele governa o país com o maior número de óbitos por dia neste momento. Mas porque o seu principal adversário voltou ao jogo político após a anulação das condenações da Lava Jato pelas mãos do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal.
E quando digo tragédia sem precedentes, é isso mesmo. Nós é que acabamos banalizando, consequência da influência presidencial. As 2.349, equivalem a quase 12 acidentes com aviões da TAM, como aquele de julho de 2007, ou pouco menos de nove rompimentos de barragens da Vale, como aquela de Brumadinho, em janeiro de 2019.
O Brasil está perdendo uma guerra, com uma montanha de novos corpos de seus cidadãos erguida diariamente. Enquanto isso, aquele que, em tese, seria o nosso general se preocupa com sua guerra particular para se manter no poder.
"O governo federal fez a sua parte até demais", afirmou Bolsonaro, também nesta quarta. Fez sim. Mas só não falou que foi em nome do inimigo.
Ele tem sido um dos grandes vetores de espalhamento dessa pereba em território nacional ao promover aglomerações e combater tanto quarentenas quanto o isolamento social. No carnaval, por exemplo, enquanto médicos, cientistas e pesquisadores pediam pelamordedeus para todos ficarem em casa, ele juntava pequenas multidões de fãs nas praias de Santa Catarina. A mensagem que passava com seus atos era de que a pandemia não era tudo aquilo, ou seja, uma "gripezinha".
Os corpos de hoje são a colheita do que foi plantado naquele feriado.
Mesmo hoje, ele não abandonou essa prática quando falou à sua base de apoiadores, em frente ao Palácio do Alvorada. "Esses governadores, não são todos, só sabem essa política do 'fica em casa'. Não deu certo ano passado, mortes tivemos, mortes continuamos tendo. Infelizmente, de uma forma ou de outra, mortes continuarão acontecendo."
Por mais que tente, agora, abraçar a vacina, ele já fez o bastante para ser lembrado. "A gente lamenta todos os mortos, mas é o destino de todo mundo", disse ele mais de uma vez, cunhando um novo lema de governo. Ironicamente, uma frase sobre a banalização da morte vai fazer com que seja imortalizado. Não da forma como ele imagina, claro.
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