Banco Central projeta juros altos por longo período e adota tom mais duro
Sinalização do BC pode adiar início da queda da Selic e elevar taxa final de 2025 acima dos 13% previstos

A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de elevar a taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, levando a Selic para 15% ao ano, surpreendeu parte do mercado. Mas, mais do que o aumento em si, o recado de que os juros permanecerão elevados por “bastante” tempo foi o que mais chamou atenção dos analistas. Segundo o Valor Econômico, a leitura mais dura (“hawkish”) da comunicação do Banco Central foi destacada por Adauto Lima, economista-chefe da Western Asset Management no Brasil.
“Apesar da surpresa com a alta de 0,25 ponto, ele [o Copom] encerrou o ciclo e usou uma comunicação bastante dura”, afirmou Lima. A Western projetava manutenção da taxa em 14,75% e esperava que o BC desse sinais mais claros de encerramento do ciclo de aperto. A decisão, no entanto, veio acompanhada de uma mensagem que reforça o compromisso da autoridade monetária com a convergência da inflação para a meta, o que, segundo o economista, pode fazer o mercado postergar as expectativas de início da flexibilização monetária.
“Os dados, principalmente os de atividade econômica, surpreenderam o mercado e o BC. Isso gerava alguma desconfiança sobre se o processo de aumento de juros já teria parado. Discutimos internamente e havia a possibilidade de darem 0,25 ponto e fecharem a porta. Foi o que aconteceu. Eles encerraram o ciclo e assumiram que, para voltarem a subir juros, seria preciso ter surpresas bastante negativas daqui até a próxima reunião”, explicou o economista da Western.
Na avaliação de Lima, a autoridade monetária deixou claro que a queda da Selic dependerá da consolidação de expectativas mais firmes em relação à inflação. “O mercado já vinha tirando parte da queda [dos juros futuros] há algumas semanas e movendo mais para a frente, e a comunicação do Copom foi nesse sentido, de reforçar que, para os juros caírem, é preciso ter uma inflação mais baixa e garantia de convergência para 3%.”
Diante desse cenário, o economista admite rever suas estimativas para o início do ciclo de cortes. Atualmente, a projeção da Western é que a flexibilização comece entre o fim do primeiro trimestre e o início do segundo trimestre de 2026. “Talvez o processo de cortes fique mais para o fim do primeiro semestre ou somente na segunda metade do ano. Além disso, a taxa no fim do ano que vem pode ser mais alta, acima dos 13% que vemos agora.”
Lima ressalta que a condução da política monetária está diretamente ligada à credibilidade das metas e ao equilíbrio fiscal. “Se houver uma melhora das expectativas e uma confiança maior na convergência da inflação, o BC pode ser ajudado. Por isso a batalha das expectativas é tão importante, já que boa parte da desancoragem é mais ligada à desconfiança com a questão fiscal”, concluiu.
"Incompreensível", diz Gleisi sobre novo aumento da taxa de juros pelo Banco Central
A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central de elevar novamente a taxa básica de juros (Selic), desta vez para 15% ao ano, foi recebida com forte reprovação por integrantes do governo federal e lideranças do Congresso. A medida foi anunciada na noite de quarta-feira (18) e repercutiu imediatamente nas redes sociais e nos bastidores de Brasília. Trata-se do sétimo aumento consecutivo da Selic, que alcança agora o nível mais alto desde julho de 2006.
A ministra das Relações Institucionais do governo Lula (PT), Gleisi Hoffmann (PT), classificou a decisão como “incompreensível”. Em publicação na rede X, nesta quinta-feira (19), ela declarou: “no momento em que o país combina desaceleração da inflação e déficit primário zero, crescimento da economia e investimentos internacionais que refletem confiança, é incompreensível que o Copom aumente ainda mais a taxa básica de juros. O Brasil espera que este seja de fato o fim do ciclo dos juros estratosféricos”.
O ciclo de altas iniciado em setembro de 2024 foi mantido de forma unânime pelo Copom, que justificou a postura mais agressiva diante de uma inflação considerada persistente — sobretudo no setor de alimentos. A taxa Selic saiu de 10,50% para os atuais 15% em menos de um ano, sob o argumento de conter as pressões inflacionárias e garantir a convergência da meta de inflação até 2026.
Segundo nota oficial, o Comitê reconheceu que os índices futuros ainda estão acima da meta. “Para assegurar a convergência da inflação à meta em ambiente de expectativas desancoradas, exige-se uma política monetária em patamar significativamente contracionista por período bastante prolongado”, afirmou o BC.
Para o líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (RJ), a taxa básica de juros está “indecente” e o aumento não pode ser tratado como algo "normal".
“Não dá pra aceitar como normal o novo aumento da Selic pelo Banco Central. A taxa de 15% é indecente, proibitiva e desestimula investimentos produtivos. É a transformação do Brasil no paraíso dos rentistas: quem vive de juros ganha, quem trabalha perde”, escreveu em publicação na rede social X, nesta quarta-feira (18).
Farias também questionou o impacto da política de juros nas contas públicas. Segundo ele, o crescimento da dívida não é causado por programas sociais, mas sim pelo pagamento de juros.
“Falam muito de ajuste fiscal e da dívida pública. Mas o crescimento da dívida não vem dos programas sociais com saúde ou educação — vem do pagamento de juros. Em 2024, o déficit nominal foi de R$ 988 bilhões. Sabe quanto foi de gasto primário (políticas públicas de saúde, educação, previdência etc.)? R$ 18 bilhões. Os outros R$ 970 bilhões foram para juros da dívida”, continuou.
O deputado ainda cobrou coerência do Banco Central ao lidar com a questão fiscal. Ele também criticou a estrutura tributária, que, segundo ele, protege os super ricos e penaliza os mais pobres.
“O Banco Central não pode ignorar o impacto fiscal de sua política monetária. Se dizem que a dívida preocupa tanto, por que a política de juros não considera o custo que ela própria impõe às contas públicas? Vejam o tamanho do problema: o sistema tributário é absolutamente desigual, os super ricos não querem pagar impostos, ganham muito dinheiro com as aplicações com juros altos e insistem em cortar programas sociais de saúde e educação, bem como desvincular o salário mínimo da previdência”, completou.
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