Religião

A fé viva que transforma atua no mundo da política

Não vejo um futuro promissor sem o fortalecimento fraternal das famílias e das comunidades


Foto: Montagem pensarpiauiNazareno Fonteles
Nazareno Fonteles

Por José Nazareno Cardeal Fonteles, professor 

Há mais de uma década, tive a oportunidade de contribuir com um texto para o livro "Os Cristãos leigos no MUNDO DA POLÍTICA", organizado por José Ernanne Pinheiro e Antonio Aparecido Alves e publicado pela editora Vozes em 2013. Nesse texto, compartilhei reflexões que considero ainda muito pertinentes nos dias de hoje, abordando a importância da integração entre fé e política.

Sempre encarei a política partidária como uma forma de diaconia e missão, ou seja, como um serviço ao povo de Deus. Nessa perspectiva, é fundamental que a fé e a política caminhem sempre juntas, integradas e fortalecidas por uma formação permanente em ambas as dimensões. Desde o início da minha militância partidária, busquei pautar minhas escolhas e atuação por critérios evangélicos, inspirados pelas reflexões e leituras de autores da Teologia da Libertação e pelos exemplos de seus mártires e líderes.

Ao longo de quase quatro décadas de militância partidária, nunca deixei de buscar o aprimoramento espiritual e intelectual por meio da leitura e meditação de textos de teólogos da libertação, da Bíblia e seus comentários. Essa prática diária tem sido essencial para o discernimento nas ações, gestos e decisões políticas, independentemente de viagens e lugares. Procuro meditar a Palavra do Senhor em diversos momentos do dia, como nas caminhadas, nos intervalos das reuniões e antes de dormir.

Admiro profundamente Mahatma Gandhi, suas reflexões, atitudes e a forma como enfrentava grandes desafios. Desde a adolescência, quando li sua autobiografia "Minha vida e minhas experiências com a verdade", fui marcado pela convicção de não separar os fundamentos da fé da prática política. Para mim, Gandhi foi um grande discípulo de Cristo, um verdadeiro santo cristão, pois "ninguém tem mais amor do que aquele que dá a vida pelos irmãos" (Jo 15, 13).

Jesus, o Homem Pleno, sempre foi e continua sendo meu mestre, meu ídolo, meu líder e meu Senhor. Nunca houve outro personagem que ocupasse esse lugar em minha vida, desde que tomei consciência disso. Admiro muitos, mas jamais tive dúvidas sobre essa constatação, que percebi conscientemente já na idade adulta.

Somente pela fé, com a disponibilidade progressiva do coração e a gratuidade do Espírito de Amor Gratuito, é possível reformar e aperfeiçoar a realidade humana, tanto na dimensão pessoal quanto comunitária, projetando-a a um nível mais elevado de liberdade e fraternidade, rumo à plenitude humana. Isso abrange também o âmbito da política, com todos os seus desafios, perigos e tentações.

Afirmo que somente com uma fé viva e ativa em Jesus Cristo é possível fazer da política a caridade maior, como pensou Paulo VI. Não há fé verdadeira em Jesus se Ele não for o único Mestre e Senhor, e sendo assim, os pobres e necessitados serão os preferidos dos políticos que têm fé nele, conforme o texto de Mateus 25: “Venham benditos de meu Pai! Recebam por herança o Reino preparado para vocês desde a criação do mundo. Pois tive fome e vocês me deram de comer, tive sede e me deram de beber ... Então os justos lhe perguntarão: ‘Senhor, quando foi que te vimos com fome e demos de comer, com sede e te demos de beber...’ E respondendo, o Rei lhes dirá: ‘Eu lhes garanto: Todas as vezes que vocês fizeram isso a um desses irmãos mais pequeninos, foi a mim que o fizeram'...”(Mt 25, 31-46).

Não vejo um futuro promissor sem o fortalecimento fraternal das famílias e das comunidades. Políticas públicas que não levam isso em consideração estão fadadas ao fracasso. É necessário mais diálogo e democracia fraterna na convivência do casal e desse com os filhos. Se a família, uma estrutura criada antes de qualquer outra organização social maior, for mal sucedida na vivência e testemunho dos direitos, o Estado e a sociedade fracassarão. Como sustentar princípios e valores cristãos numa sociedade sem famílias se formando na fé, na esperança e no amor gratuito?

Aprendi cedo que, sem mudanças progressivas e contínuas nas estruturas de poder, buscando a ampliação das liberdades, da democracia e da participação popular, não acontecem transformações progressistas e verdadeiramente evangélicas. Isso vale para o Estado, a família, a sociedade organizada e as igrejas. Não podemos pregar um valor e seguir outro, nem agir de forma diferente nas estruturas em que atuamos. É preciso, diariamente, tirar a trave dos olhos das organizações em que se atua para poder ser eficaz na retirada do cisco dos olhos das outras organizações que se quer reformar ou transformar de maneira mais profunda e radical.

Agindo assim, reformas humanas profundas virão, ao longo da história e no rumo da vontade do Senhor, libertando o povo de Deus das diversas dominações, numa aproximação crescente do Reino Definitivo de Liberdade e Amor Gratuito. Esse Reino é dádiva e dom gratuito de Deus, mas Ele mesmo quis que participássemos de seu esboço aqui na Terra, com nossos esforços, dons, talentos e dedicação, misturados com o fermento da fé, da esperança e do amor gratuito: "Nisto se manifesta a glória de meu Pai: em que deis muito fruto e vos comporteis como meus discípulos" (Jo 15, 8).

  JNCF

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