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Morre, aos 86 anos, o diretor teatral José Celso

Ele estava na UTI depois de sofrer queimaduras durante um incêndio em seu apartamento

Foto: Montagem pensarpiauiZé Celso
Zé Celso

Morreu nesta quinta-feira (06), aos 86 anos, o diretor de teatro José Celso Martinez Correia. Ele estava na UTI do Hospital das Clínicas de São Paulo, intubado depois de sofrer queimaduras durante um incêndio em seu apartamento, no bairro do Paraíso, na Zona Sul de São Paulo.

José Celso Martinez Corrêa era natural da cidade de Araraquara. Ele nasceu em 30 de março de 1937. Ficou popularmente conhecido como Zé Celso.

Seu trabalho, encarado às vezes como orgiástico (Que se refere a orgia-bacanal)  e antropofágico, iniciou-se no fim da década de 1950, e se definiu na década de 1960 quando Zé Celso liderou o importante Teatro Oficina − grupo formado quando integrava o Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo − onde apresentava sua inquietude e irreverência, realizando trabalhos de caráter inovador. O Oficina é sediado no bairro do Bixiga, no Centro da capital paulita.

Nessa época, destacam-se as encenações de Pequenos Burgueses (1963) − peça que enfoca a Rússia às vésperas de sua Revolução e evidencia numerosos pontos de contato com a realidade nacional anterior ao golpe militar de 1964 −, O Rei da Vela (1967), de Oswald de Andrade − espetáculo-manifesto tornado emblema do movimento tropicalista − e Na Selva das Cidades (1969), obra de Bertolt Brecht que trata da profunda crise que atravessava o país e a equipe artística. Pequenos Burgueses, embora suspenso em abril de 1964 por autoridades militares que acabavam de tomar o poder, rendeu a José Celso todos os prêmios de melhor direção do ano e as críticas colocaram a produção como a mais perfeita encenação do teatro brasileiro; a apresentação retornou aos palcos no mês seguinte.

Interessado em eventos culturais, artísticos e políticos, Zé Celso atualmente se intercala entre o cinema e o teatro. Trabalhou em Encarnação do Demônio (2007), de José Mojica Marins (lançado em 2008), dirige e atua em inúmeras peças teatrais, ainda comandando o Teatro Oficina, mesmo depois de cinquenta anos − como em Santidade (2007). Por experimentar formas ousadas de se realizar uma peça teatral, Zé Celso já se viu entre críticas internacionais. Num caso mais recente, sua peça Os Sertões, quando montada em 2005 em Berlim, Alemanha, causou polêmica na capital pelo fato dos atores ficarem nus em determinadas cenas. A imprensa alemã apelidou a montagem de “teatro pornô”.

Desde os anos 2000, luta contra o Grupo Silvio Santos, que busca construir um empreendimento comercial nos arredores do Teatro Oficina, cujos traços originais, projetados pela arquiteta Lina Bo Bardi, interagem com vizinhança ameaçada pela incorporação imobiliária. Embora José afirme que sua relação com Silvio Santos seja boa,  a disputa se estende há anos.

Trabalhando − seja dirigindo, adaptando, ou realmente numa colaboração − com nomes que vão de Augusto Boal, Henriette Morineau, Fernanda Montenegro, Sérgio Britto, Raul Cortez, Bete Coelho e Flávio Império a Chico Buarque, William Shakespeare, Nelson Rodrigues, Max Frisch, Bertolt Brecht e Máximo Gorki, Zé Celso construiu um dos mais originais percursos dos palcos brasileiros. Com a realização de Vento Forte Para um Papagaio Subir (2008) − de sua própria autoria e montada primeiramente em 1958.

Filho de José Borges Correia e Angela Martinez Carrera, José Celso nasceu no interior de São Paulo numa família de ascendência portuguesa, espanhola e italiana.

De 1955 a 1960, em São Paulo, Zé Celso entrou para o curso da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, mas não exerceu a profissão, ficando inconcluso. Porém, foi durante tal curso de graduação na USP que o dramaturgo ali formou o Teatro Oficina.

Zé Celso começou profissionalmente no teatro com uma peça de sua autoria, Vento Forte para Papagaio Subir, em 1958, e A Incubadeira (1959), também de sua autoria. Com a direção de Amir Haddad, o Oficina produz as duas peças. A Engrenagem, encenada pelo grupo em 1960, tem o intuito de homenagear Jean-Paul Sartre que visitava o país; a peça foi traduzida e adaptada juntamente com Augusto Boal. Para Zé Celso e sua trupe, o ano de 1961 é marcante: o Oficina inaugura sua fase profissional com uma casa de espetáculos alugada na Rua Jaceguai. A empresa é composta pelos sócios Renato Borghi, José Celso Martinez Corrêa, Ronaldo Daniel (que depois se torna importante diretor na Inglaterra, como Ronald Daniels), Paulo de Tarso e Jairo Arco e Flexa.

A estreia de José Celso como diretor vem com A Vida Impressa em Dólar, de Clifford Odetts, e a peça abre a programação da nova estadia do grupo na casa de espetáculos alugada. Entre o elenco, estava Eugênio Kusnet que, por ser conhecedor profundo do Método Stanislavski, colaborou na preparação dos atores. Essa montagem fez com que Celso ganhasse o prêmio de revelação de diretor pela Associação Paulista de Críticos de Teatro. Depois da montagem de Todo Anjo é Terrível, em 1962, a equipe encena Pequenos Burgueses, de Máximo Gorki, que teve enorme repercussão. Pequenos Burgueses rende a José Celso todos os prêmios de melhor direção do ano.

No mês passado, Zé Celso se casou com Marcelo Drummond, de 60 anos. Os dois estão juntos desde 1986, totalizando 37 anos de relação. Os dois se conheceram no Teatro Oficina, em 1986. No mês seguinte, foram morar juntos e permanecem unidos até hoje.

Em entrevista à jornalista Cleo Guimarães, Marcelo afirmou que ele e Zé Celso não se relacionam sexualmente há mais de 20 anos: “Estamos casados pela vida que vivemos, compartilhamos tudo. Moramos juntos, mas não transamos há mais de 20 anos, cada um tem seus amantes.”

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