Política

Os hematomas sociais na história da política brasileira

Os hematomas sociais na história da política brasileira

  • quinta-feira, 31 de março de 2016

A CULTURA DEMOCRÁTICA BRASILEIRA
A política brasileira foi sempre marcada por “hematomas sociais”, causando sobressaltos na democracia que, nunca conseguiu sua emancipação dos regimes totalitários. Lendo a história da política brasileira percebe-se que ela foi sempre caracterizada por intervalos de estado de exceção. O Estado brasileiro foi erguido por muitas ditaduras, através de golpes civis e militares. O Brasil nunca passou mais de 30 anos sem sofrer uma intervenção vertical no seu regime político. Sempre houve movimentos de ultra direita que não suportam conviver com o regime democrático. Ainda que, em meio a estes reveses políticos o Brasil é um país que coleciona muitas conquistas voltadas para os anseios populares, o que denota a luta e a conquista política em prol dos direitos dos cidadãos. O que vale notar é que todas as conquistas emancipatórias que se tem notícia no Brasil tiveram sempre a condução popular como guia, apesar da historiografia brasileira não reconhecer esta realidade.
A passagem da Brasil colônia para o Brasil império aconteceu às custas de muitos protestos, onde o povo nas ruas gritou e exigiu a independência do Brasil da tutela de Portugal. Mas, nos manuais oficiais da história do Brasil o que aparece ressaltado é a figura de Dom Pedro I, rei de Portugal, gritando “independência ou morte”! Isso dá a impressão de que, só ele por seus méritos de estadista conquistou a Independência do Brasil. E o povo organizado que fazia esta reivindicação em nome da sociedade civil, onde ficou? Nas revoluções populares realizadas no Brasil, o povo não aparece como sujeito social da mudança política. A história popular brasileira de luta ainda precisa ser contada e registrada nos manuais políticos. Infelizmente em nossos manuais de história política só aparecem as figuras heroicas de Dom Pedro I, Duque de Caxias, entre outros personagens.
A mesma coisa sucedeu na passagem do Brasil Império para o Brasil República. Parece que a República do Brasil foi uma conquista pessoal do heroísmo do Marechal Theodoro da Fonseca, resultado de sua briga política com seu colega de patente marechal Floriano Peixoto. A história é bem outra. A passagem do Brasil Império para o Brasil República se deu às custas de “muitas Peleias” e até mesmo, de derramamento de sangue daqueles que sonhavam com um Brasil democrático republicano. Sem a história da resistência popular acontecida no Brasil a cultura política brasileira ficará em dívida com os reais heróis, que são o povo organizado na sociedade civil e nos movimentos alternativos de luta emancipatória.
Apesar das conquistas políticas populares, o Brasil foi quase sempre governado por governos antipopulares. Os constantes regimes de exceção fizeram do Brasil um país com muitas promulgações de Constituição. A cada passagem do regime de exceção para o regime democrático foi organizada uma constituinte especial para formular uma nova constituição. Isto mostra que não temos uma tradição democrática estável, denotando uma fragilidade política, uma ameaça direta à democracia.
A fragilidade política de uma nação é o caminho aberto para o surgimento de novos estados de exceção que são ameaças constantes à democracia e aos direitos privados e coletivos. A consolidação da política no Brasil se deu numa luta permanente do movimento popular para afirmar a democracia. O Brasil sempre foi governado pela elite econômica, com raríssima exceção. Apesar dessa tradição da política aristocrática desenvolvida no Brasil, é preciso reconhecer que sempre houve uma tensão das forças populares reivindicando direitos de participação democrática na política. A conquista da emancipação política do Brasil se deu com o rompimento da sombra do regime de exceção que teimou e teima em mostrar suas garras totalitárias para aniquilar as forças reivindicatórias de participação popular.
A última irrupção totalitária na democracia brasileira aconteceu em 01 de abril de 1964, num golpe militar que durou mais de 20 anos. Este golpe militar aniquilou com muitas iniciativas populares, matando e exilando as principais lideranças políticas do Brasil. As Consequências do golpe militar de 1964, resultaram no sumiço de deputados, lideranças juvenis, sindicais, entre outras. O método usado para silenciar as lideranças era a tortura selvagem, como o “pau de arara, os choques elétricos” e outros, como prática de silenciar e provocar intimidação social em âmbito de toda sociedade civil. Debaixo dessa cortina de ferro autoritária foi surgindo uma força silenciosa de resistência ao regime imposto pelos militares e pela burguesia brasileira. Gradativamente foram surgindo movimentos populares que, se organizaram em sindicatos e partidos políticos que, ao final foram mostrando as trincas da contradição do regime de exceção até o seu esgotamento ideológico.
As forças de resistências culminaram num movimento que no Brasil ficou conhecido como “Diretas-já”. Estas se traduziram numa marcha de protestos pelo Brasil a fora, reivindicando eleições diretas para eleger democraticamente os representantes políticos dos poderes legislativos e executivos em âmbito majoritário. Depois de muitas lutas e ainda com a manifestação da repressão imposta pelo regime de exceção foi feita uma negociação com os militares em 1979, para restabelecer os direitos políticos das lideranças brasileiras que se encontravam exiladas no exterior, através de um projeto que ficou conhecido como anistia aos exilados políticos.
Na verdade a anistia política de 1979 foi um acordo ideológico para não punir os torturadores brasileiros. Infelizmente, a justiça às vítimas do regime autoritário não foi feita até hoje. É uma dívida que pesa sobre a democracia brasileira, porque não houve punição aos culpados pela barbárie causada pelo golpe militar de 1964. Como o “verme do regime de exceção” não foi eliminado pela raiz a partir de 1985 inauguramos uma democracia que não fez o acerto de contas com o regime totalitário de 1964. É por isso que devemos ficar de memória sempre acesa para recordar que “tortura nunca mais”. Isto para se evitar qualquer “cunha” à nossa jovem democracia, que apesar da negociata de 1979, trouxe avanço social para o Brasil.
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