Pensar Piauí

Educação, desenvolvimento e valorização profissional

Confira o artigo do sociólogo e professor, Marcelino Fonteles

Foto: Montagem Pensar PiauíUFPI, UESPI e IFPI
UFPI, UESPI e IFPI

Por Marcelino Fonteles, sociólogo e professor

Considerando a conjuntura brasileira e piauiense, é oportuno se pontuar alguns tópicos  sobre educação, desenvolvimento e valorização profissional.

O professor da UFPI, Cantídio Filho, analisando a conjuntura, abordou com muita propriedade  aspectos relativos aos governos federal e estadual,  à defesa da democracia e a relação com os movimentos sindicais. É um artigo  sóbrio, profundo, com muita sensibilidade e responsabilidade e  sem  cair no populismo de fazer média para a plateia.]

Sua reflexão estimulou a vontade de apontar alguns aspectos da situação educacional, sua relação com o desenvolvimento e as  demandas por recuperação de perdas salariais,  valorização dos professores e professoras e redução das desigualdades sociais. 

As demandas salariais são legítimas, ainda que haja controvérsias sobre os índices das perdas. Mas, de fato, ocorreram perdas significativas, tanto para os professores universitários da UESPI, quanto da UFPI e também do IFPI.

Em relação as demandas salariais dos professores e professoras da UESPI, sabe-se que, como resultado das negociações com o governo, já foi suspenso o PL sobre carga horária e pesquisas. O governo se comprometeu, também, a devolver o que foi descontado por causa da greve.  E em relação às perdas salariais, o governo do Piauí se comprometeu a conceder os próximos três ajustes com valores superiores à inflação: 5,35% em 2024; 5,35% em 2025 e esse mesmo índice em 2026.

As perdas salariais são grandes e atingem a UESPI, a UFPI e o IFPI. Mas, nenhum governo poderá resolvê-las no curto prazo. Contudo é preciso que se estabeleça uma política de recuperação gradativa, dentro da realidade orçamentária. O governo estadual do Piauí, ao propor 16% parcelado, recupera timidamente pequena parte das perdas. É preciso se conhecer melhor o orçamento do Estado do Piauí para saber se, diante da demanda salarial dos professores e professoras da UESPI, e dos demais servidores do Estado, o orçamento permite melhorar essa proposta. 

Em relação á rede federal, não faz sentido a União não apresentar nem 1% de reajuste para 2024, seja para os professores das universidades federais, seja para os professores dos Institutos Federais. Será  preciso lutar para recuperar, pelo menos, parte das perdas salariais dos professores federais.

A valorização dos professores e professoras, assim como dos demais servidores públicos, deve ser parte de uma  politica estratégica de fortalecimento das políticas públicas, garantindo mais qualidade, mais estabilidade, mais amplitude e mais desenvolvimento econômico e social.

Há pesquisadores que consideram que há dois fatores muito importantes para assegurar um bom ou ótimo desenvolvimento: estabilidade e democracia.

Para a estabilidade dos serviços públicos, é fundamental ter uma política salarial satisfatória, definida e executada no médio e longo prazo. E essa politica deve ser debatida não só com os servidores, mas com representantes de outros setores da sociedade, para evitar que se "cubra um santo" e descubra os demais setores sociais.  É preciso que os recursos públicos sejam alocados de forma equilibrada e justa, para que toda a sociedade se beneficie, priorizando os mais vulneráveis.

Dessa forma, será democratizado o uso e direcionamento dos recursos e a perspectiva é que haja desenvolvimento com redução das desigualdades sociais, mais democracia e mais justiça. Assim como se assegurará a estabilidade e durabilidade dos acordos feitos nas mesas democráticas de negociações.

Uma sugestão de política de recuperação de perdas salariais: poderia se analisar a possibilidade de acordar uma política que pudesse garantir a cada ano, a inflação do ano anterior e mais a média do crescimento do PIB dos últimas dois anos. E se pactuasse um acordo dessa natureza a cada 4  ou 5 anos.  Caso, no transcurso desse período,  ocorresse alguma crise, às partes se sentariam e reavaliariam o acordo. Uma pequena ressalva em relação à essa sugestão. Para o ano de 2024, é importante que o governo federal e o governo estadual façam um esforço extra para contemplar com um percentual mais  significativo o reajuste, diante de tantas perdas e do endividamento crescente dos servidores. É preciso dar uma injeção de ânimo para os servidores públicos. Faz-se necessário que o governo, desde que possa comportar no orçamento, não se distancie do atendimento das necessidades dos servidores e das servidoras.

Os descuidos com as pautas salariais tem empurrado alguns dirigentes  e muitos servidores das bases educacionais para as hordas do fascismo. Pode-se lembrar das  tristes e equivocadas posturas fascistas, de vários dirigentes e servidores públicos, contra os governos  anteriores da ex-presidente Dilma e do ex-governador Wellington Dias.  É preciso superar os excessos de demandas corporativas, assim como é preciso ultrapassar, sempre que houver, excesso nas atitudes governamentais. O radicalismo excessivo, a inflexibilidade, parta de onde partir, pode levar a ressentimentos e afastar aliados ou potenciais aliados. O Sociólogo Pedro Demo diz que por mais desenvolvida que seja a consciência crítica, a mesma não se desfaz de sua base emocional e nem de suas crenças e crendices. E sobre as emoções e crenças se tem pouco controle. Portanto, como disse Paulo Freire, estreitar o diálogo é fundamental.

A aceleração na implantação das escolas pública de tempo integral, combinada com a educação profissional, faz parte de uma política estratégica de desenvolvimento acelerado da juventude piauiense e do Piauí. E tem sido um acerto muito grande do governo do Piauí.

Em relação ao Ensino Universitário e à pós-graduação, tem sido  estratégico para o desenvolvimento econômico e social do Piauí, as  existências das Universidades UFPI e UESPI, assim como o IFPI.  Soma-se a essas a FAPEPI e as instituições federais de fomento as pesquisas. Além dessas instituições públicas, os centros universitários privados também são importantes para o desenvolvimento do Estado.

Mas, para melhorar a qualidade do desenvolvimento e otimizar suas ações, falta se criar uma articulação entre essas instituições, seja na educação básica, seja na educação universitária, seja na pesquisa e extensão, que integre, de forma planejada, todas essas  instituições educativas, constituindo o sistema estadual de educação, ciência e tecnologia. Está-se numa conjuntura muito oportuna para a construção dessa engenharia institucional. Pois, em 2024, vence o prazo de validade do atual plano nacional de educação, e, consequentemente, em breve, vencerão os prazos de validade do plano estadual do Piauí e dos planos municipais de educação.

Em janeiro desse ano, a CONAE aprovou, democraticamente, um texto que serve de referência para o MEC elaborar a nova proposta para o Plano Nacional de Educação, que será debatida e aprovada pelo Congresso Nacional e que deverá vigorar de 2025 a 2034.

Os planos são excelentes instrumentos para se articular a criação dos sistemas educacionais: nacional, estadual e municipais. É fundamental a criação do sistema estadual de educação, ciência e inovação tecnológica, constituído democraticamente, para que as instituições tenham uma comunicação, um diálogo no seu planejamento estratégico,  no sentido de evitar sobreposição desnecessária de ofertas de cursos, quando, muitas vezes, não há demanda para isso, assim como se deve planejar de forma integrada e alinhada, a criação de novos cursos, atendendo não só às áreas tradicionais, mas, também às novas vocações de desenvolvimento que estão emergindo no Estado do Piauí. Deve-se fazer isso sempre, não de forma atomizada ou fragmentada, mas, de forma articulada e integrada, ou seja, criando o sistema estadual de educação do Piauí alinhado ao sistema nacional de educação.

Além disso, é fundamental que tanto a educação básica, quanto a educação universitária, estejam ancoradas num projeto político educacional democrático cidadão e científico, que contribua para a formação crítica, científica e cidadã de cada um e cada uma de seus sujeitos. Promovendo uma nação consciente, humanista, protagonista e competente social, político e profissionalmente. Uma educação que desconstrua o fascismo,  o autoritarismo, o machismo e o racismo e os demais preconceitos e consolide a democracia, a cidadania, o diálogo e acelere o desenvolvimento cientifico e tecnológico sustentáveis.

Agora veja o artigo de Cantídio Filho 

O Brasil que queremos  

O contexto econômico e social que enfrenta o governo Lula 3 é diferente do Lula 1 e 2. Estes, naquele contexto, tiveram condições mais favoráveis para viabilizar pautas do povo e dos movimentos populares.

Lula 3 vive o semipresidencialismo. O Congresso divide o poder com o executivo na execução do orçamento, sem falar que não temos maioria para aprovar pautas que promovam igualdade social.

Governos Temer e do Bozo arrocharam salários dos servidores, reduziram recursos para área social e impuseram uma agenda de retirada de direitos. No caso dos servidores públicos, basta ver as diversas tentativas de aprovar uma reforma administrativa, que retira direitos.  

Lula 3 ainda na transição, garantiu recursos orçamentários para viabilizar 9% de reajuste para os servidores do executivo, fato que foi viabilizado em 2023. Tirou de pauta a reforma administrativa, que a direita via Arthur Lira, tenta a toda hora pautar no Congresso conservador.

No governo Lula 3, assim como nos Lula 1 e Lula 2, os movimentos sociais retomaram o espaço de interlocução, para negociar pautas sociais e econômicas.

É certo e de direito que os movimentos sociais pressionem o governo pelo atendimento de suas pautas. Agora, isso não dá direito nem do governo e nem dos movimentos sociais usarem de radicalismo e de intransigência nas negociações. É preciso buscar equilíbrio e sensatez no atendimento de reivindicações. Significa que Lula 3 não é inimigo dos movimentos sociais. Movimentos sociais não devem tratar o Lula 3 como inimigo.  Significa dizer que essa postura além sadia, deve servir de referência para governos estaduais democráticos populares.

Agora, cabe aos movimentos hoje disputar nas ruas e junto ao Congresso Nacional a pauta (projeto democrático que promova igualdade social) e influir de forma mais decidida na agenda do governo. Isto ajudaria Lula 3 a viabilizar pautas do povo e dos movimentos populares. Infelizmente, isto não vem acontecendo, quem vem pautando em grande parte os rumos do governo é o Congresso conservador e até mesmo a extrema direita.

Negociação com servidores  

No último dia 28 de fevereiro houve mais uma rodada de negociação do governo Lula 3 com os servidores federais do executivo. No ano passado, o governo concedeu 9% de reajuste. E propõe 4,5% em 2025 e 4,5% em 2026. As perdas referentes aos governos Temer e Bolsonaro alcançaram 30%. Não propôs reajuste salarial este ano. Propôs reajustar o ticket alimentação, o auxílio creche e a contrapartida nos planos de saúde a partir de maio deste ano. Na última mesa, afirmou que só dará reajuste condicionado ao aumento da arrecadação.

Não tem mais sentido os movimentos sociais pressionarem Lula 3 apenas por pautas salariais e interesses corporativos. O momento cobra compromissos e contrapartidas de todos os lados envolvidos.

Portanto, nós servidores, termos sidos indiferentes e até condescendentes com os governos Temer e Bozo - que nem mesa de negociação tinha - e, que amargamos retiradas de direitos e arrochos salariais, não nos dá o direito de tratarmos agora Lula 3 como inimigo. Isto vale também para o governo Lula 3, que não deve ser apenas permissivo com o Congresso Conservador e as grandes corporações privadas, principalmente aquelas que sonegam impostos.

Sinto falta do povo nas ruas, da renovação dos movimentos sociais, da luta democrática pelos rumos do Brasil que queremos!

Brasil que queremos  

Somos novamente desafiados a ajustar contas com o passado de golpes. É fato que em todas ocasiões históricas que houveram golpes, uma classe social conservadora e atrasada saiu feliz. Ou porque garantiu o golpe ou porque foi anistiada.

Somos desafiados mais uma vez a passar a limpo essa lógica, cuja oportunidade foi desperdiçada pelos governos democráticos populares pós-ditadura de 1964.

Dessa vez não tem guerrilha da esquerda para "contrabalançar" os crimes cometidos pelos militares e assim justificar "uma anistia geral e irrestrita". Desta vez tem somente uma classe social conservadora (atrasada) que agiu sozinha para dar um golpe no dia 08 de janeiro de 2023, que não deu certo e que agora quer sair novamente feliz, sendo anistiada.

Esse povo que tentou dar um Golpe de Estado não deve sair feliz de novo com uma possível anistia do Congresso, sob pena desse ciclo se repetir e da próxima vez tenham sucesso - repito - tal como tiveram em 1964 e nas outras oportunidades. 

REPETINDO: Sinto saudades da falta do povo nas ruas, da renovação dos movimentos sociais, da luta democrática pelos rumos do Brasil que queremos!  
Cantidio Filho- Jornalista e Professor da UFPI

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