BBC: Por que 60% dos eleitores de Bolsonaro são jovens?
BBC: Por que 60% dos eleitores de Bolsonaro são jovens?

Jair Bolsonaro aparece em segundo lugar nas pesquisas de intenções de voto para a Presidência da República. Na mais recente pesquisa Datafolha, 16% dos eleitores dizem votar nele. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) figura em primeiro ligar, com 36%, e atrás, Marina Silva (Rede), com 14%.
Neste cenário, um detalhe tem chamado a atenção de analistas e cientistas sociais e foi abordado em matéria especial da BBC no Brasil nesta quinta, 16: 60% dos eleitores de Bolsonaro têm entre 16 e 34 anos. Desses, 30% têm menos de 24 anos. "Por que parte da juventude apoia de maneira apaixonada um ex-militar cuja atuação em seus 26 anos de Congresso (sete mandatos) vinha tendo pouco brilho?", indaga a reportagem.
A explicação mais lógica perpassa pelo uso que o político fez da redes sociais. Atualmente, seu perfil no Facebook tem 4,7 milhões de seguidores. Mas os números revelam que apenas 68% dos eleitores têm acesso frequente à internet. Alguns especialistas também acreditam que a perfomance de Bolsonaro deve reduzir em 2018 quando a campanha iniciar de fato na TV e no rádio.
Bolsonaro como anseio da juventude da classe média urbana é outro explicação dada pela BBC ao observar a opinião de Danilo Cersosimo, diretor do instituto de pesquisas Ipsos. "É um movimento de um jovem escolarizado que não conseguiu ver as suas aspirações atendidas", afirma o analista. "Ele pode estar desempregado, ou tem um emprego ruim, tem medo da violência e da crise econômica. Então ele culpa o governo por não conseguir cumprir suas ambições. E quem estava no governo? O PT e a chamada esquerda."
Youtubers influentes é outro explicação dada para o avanço da direita em relação aos mais jovens, segundo a BBC. O Movimento Brasil Livre (MBL), por exemplo, é uma das páginas de maior influência no Facebook, com 2,5 milhões de seguidores. Apesar de não declararem oficialmente apoio a Bolsonaro, os militantes do MBL também costumam repassar as propostas do parlamentar, como maior rigidez no combate ao crime.
A reportagem da BBC observa que Bolsonaro começou a ganhar simpatizantes depois dos protestos de junho de 2013, quando milhões de jovens tomaram as ruas para, primeiro, protestar contra o aumento das tarifas de transporte e, depois, contra governos e políticos. As manifestações surgiram com o Movimento Passe Livre (MPL), grupo de esquerda que, apesar de não gritar contra partidos, dizia-se apartidário. Em seguida, os protestos foram "cooptados" por manifestantes de direita, que chegaram a proibir bandeiras de partidos."Eram protestos essencialmente para mostrar um descontentamento com governos progressistas de esquerda, que não conseguiram implementar reformas estruturais e que acabaram se alinhando justamente ao sistema econômico que antes criticava", explica Moysés. Mauro Paulino, diretor do instituto Datafolha, concorda que o movimento "antipolítico" começou a mostrar as caras naquele ano. "Em 2013, as manifestações já tinham um caráter de negação de qualquer bandeira política", diz. "Bolsonaro sabe muito bem utilizar as redes sociais, conhece a linguagem que viraliza, usa frases curtas de efeito apelativo, cria polêmica, fala o que pensa. Ele é um performer", diz Esther Solano, doutora em ciências políticas e professora da Universidade Federal de São Paulo. Para Moysés Pinto Neto, professor de filosofia da Universidade Luterana do Brasil, Bolsonaro criou um personagem midiático que joga com a incerteza sobre o tom do que diz. "Em um vídeo (gravado em 1999), ele disse que mataria pelo menos 30 mil pessoas no Brasil. Ele está falando sério ou não? Não dá pra saber", diz o acadêmico, que vem pesquisando como movimentos sociais de direita atuam nas redes sociais.
A matéria da BBC reconhece que a paixão por Bolsonaro vem associada a ideias de crescimento econômico, combate à violência e até mesmo o apoio ao regime militar. "Paulino, do Datafolha, afirma que Bolsonaro se aproveita de um dos "maiores medos" da população, a violência, para alavancar seu apoio popular. "Principalmente entre a classe média, há um aumento do apoio à pena de morte e ao enfrentamento ao crime como forma de combater a violência. Essa é a principal bandeira dele", explica".
Seus "possíveis eleitores" defendem o armamento civil e o militarismo. "Precisa haver o armamento civil. O (estatuto do) desarmamento foi uma farsa, a violência só piorou, porque o cidadão de bem ficou indefeso. O bandido continua com as armas", diz Gabriel Araújo, de 22 anos.
"Outsider"
Segundo pesquisadores ouvidos pela BBC Brasil, o político conservador se apresenta como um "outsider", ou seja, diz que não faz parte da política tradicional, cuja imagem é de corrupção. Ele se mostra contra o chamado "establishment", as mais poderosas instituições e organizações políticas, midiáticas e econômicas do país. Temas como descriminalização do aborto e casamento LGBT seriam do interesse desse "establishment", na visão dos conservadores. "É uma característica do jovem ser do contra, buscar a mudança, as transformações sociais. Ele é mais receptivo aos discursos radicais, à esquerda e à direita", diz o cientista político Hilton Cesario Fernandes, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fespsp).
Esquerda
Para o professor Moysés Pinto Neto, a esquerda não conseguiu se aproveitar do descontentamento mostrado nos protestos para engrossar suas fileiras. "O que aconteceu foi o inverso. A direita, que sempre foi o establishment, começou a se mostrar como crítica ao sistema, como se estivesse fora dele e fosse a solução para os problemas. Nos Estados Unidos, isso levou à eleição de Donald Trump", explica Pinto Neto.
Paulino afirma ainda que há uma "crise de representação" da população brasileira em relação aos políticos. É o tipo de ambiente favorável ao surgimento de "salvadores da pátria". "Esse vácuo permitiu que figuras como Bolsonaro surgissem. Quando a política não resolve, ideias simples para problemas complexos parecem a melhor solução, apesar de, na prática, elas nem sempre funcionarem", diz. Com o slogan de "gestor" e "trabalhador", o empresário João Doria também aproveitou esse sentimento antipolítico para vencer as eleições de 2016 e se tornar prefeito de São Paulo. Ainda de acordo com a reportagem, no meio acadêmico, uma das análises para a ascensão da direita é a de que, do outro lado do espectro político, a esquerda partidária não ofereceu nenhum novo nome com alcance parecido ao de Bolsonaro. O principal expoente ainda é Lula (que lidera as pesquisas eleitorais com 36% das intenções de voto). "Com os escândalos de corrupção, o impeachment de Dilma Rousseff, a condenação do ex-presidente por corrupção passiva e o desgaste acumulado pelo PT, a maior parte dos militantes da esquerda se viu "órfã" de nomes promissores, segundo análise de cientistas sociais. Nessa perspectiva, a esquerda sobrevive em grupos sociais que não têm relação direta com partidos, como o movimento negro, o feminismo, o LGBT e os secundaristas".
O cientista político Hilton Cesario Fernandes, da Fespsp, argumenta que o apoio da juventude não será suficiente para a vitória da extrema-direita. "O discurso radical pega uma parcela da população específica, mas dificilmente convence a maior parte da população numa disputa majoritária, diz. Por outro lado, Bolsonaro vem crescendo em levantamentos do Datafolha desde dezembro de 2015, quando tinha 5% das intenções de voto. No último, em outubro deste ano, estava com 16 %.
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