Pensar Piauí

A mensagem e a práxis histórica de Jesus de Nazaré

Feita a partir a partir de uma leitura atenta, vigilante e meditada dos Evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e João)

Foto: Jornal Grande BahiaJesus Cristo

 

Por Nazareno Fonteles, professor, para o pensarpiaui (2019)  

A partir de uma leitura atenta, vigilante e meditada dos Evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e João), podemos resumir a mensagem e a práxis histórica de Jesus de Nazaré, o Filho do Homem, assim:


1.Amar uns aos outros assim como Ele nos amou, isto é, se doar até à morte pelo bem de todos, começando pelos mais sofridos, necessitados e marginalizados.
2.Vigiar e orar sempre para agir na direção e no sentido da realização do Reino da Fraternidade, que tem o primeiro como princípio gerador.

A Espiritualidade Fraterna é aquela que se fundamenta nesses dois princípios. Ela está ao alcance de todas as pessoas, independente de religião, de igreja e de cultura. É a Espiritualidade para o agir e conviver bem, na família, na comunidade, na cidade, no país e no mundo. Sua prática cotidiana, nos leva ao  aprimoramento contínuo de nossa vida no rumo da Vida de Amor fraterno pleno, nos premiando muitas vezes com alguns momentos intensos e encantadores de nossas vidas pessoais, familiares e comunitárias,  os quais alimentam a nossa esperança ativa e perseverante de que essa utopia é possível e que se realizará, em plenitude, no futuro. 

Muitas vezes, em encontros, reuniões ou palestras, temos colocado algumas questões. Seria justo que os que se doaram até à morte, nas gerações passadas, em prol de uma sociedade mais justa e fraterna no futuro, não tivessem a oportunidade de compartilhar desse futuro feliz? Como admitir que as vítimas inocentes de todas as violências, guerras, ódios e doenças, não tenham a oportunidade de usufruírem de uma vida plenamente feliz, numa comunidade fraternalmente plena? Que absurdo há em se sonhar algo tão bom assim que pode nos encher de entusiasmo cotidiano na vida atual, dando-lhe um Sentido Maior, mesmo diante de todos os seus limites, fracassos e insuficiências? 

Com a vida humana plena de Jesus Cristo, ocorrida em certo momento de nossa História, tornou-se possível para todos nós sermos companheiros dEle, aqui na terra, na construção inicial do Reino da Fraternidade, que é o Reino de Deus pregado por Ele. E qual é o obstáculo maior para que isso se torne possível? É a morte. 

Mas se Jesus, vivendo a humanidade plena, venceu a morte com a sua Ressurreição, então essa dádiva extraordinária da vida humana se tornou possível para nós também. E assim todas as injustiças e absurdos acontecidos ao longo da história serão superados. Porque “o desenlace da vida de Jesus só é encontrável na resposta de Deus ao ressuscitá-lo, pois assim Ele indiretamente censura os poderes do antirreino, as pessoas e as estruturas que se esqueceram desse marginalizado, desse inocente, e inclusive o levaram à morte. 

A ressurreição é um modo de dizer que Deus se coloca a favor do justo condenado, da vítima, do pobre, do enfermo, do esquecido”, como escreveu Rafael Luciani em sua obra “Retornar a Jesus de Nazaré”. Mas veja bem, é preciso viver no aqui e no agora, buscando perseverantemente “agir”, como Jesus agiu entre nós, para que isso seja possível. E Ele mesmo, conforme  Jo 14, 12-13, disse: “Em verdade, em verdade vos digo: quem crê em mim, fará as obras que eu faço, e fará ainda maiores do que estas, pois eu vou para o Pai. E o que pedirdes em meu nome, eu o farei, a fim de que o Pai seja glorificado no Filho.” 

Ou seja, não podemos dizer que acreditamos em Jesus Cristo se não praticamos, ou pelo menos tentamos praticar, ações semelhantes às dEle, as quais são todas realizadas no Amor fraterno pleno, para o bem de todos, começando pelos mais humildes e sofridos. Lembremos aqui de Mt 25,34-36; 40: “Vinde benditos de meu Pai! Recebei em herança o Reino que meu Pai vos preparou desde a criação do mundo; pois eu estava com fome, e me destes de comer; estava com sede, e me destes de beber; eu era forasteiro, e me recebestes em casa; estava nu, e me vestistes; doente, e cuidastes de mim; na prisão, e viestes até a mim...Em verdade, vos digo: todas as vezes que fizestes isso a um destes mais pequeninos que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes!” 

Agora reflitamos um pouco em algumas implicações práticas, nos dias de hoje, da Espiritualidade Fraterna ensinada por Jesus na sua convivência histórica. Podemos dizer que agimos como cristãos verdadeiros quando não nos importamos com os que mais sofrem em nossa comunidade ou povo de Deus? Por exemplo,  somos cristãos, seguidores de Jesus Cristo, quando discriminamos os pobres, os negros, os gays, as mulheres, os idosos, os doentes, os presos, os imigrantes, os adolescentes, as crianças e os ativistas dos direitos humanos? E somos cristãos quando nos omitimos, dizendo que “não temos nada a ver com isso”, nas lutas, manifestações e movimentos sociais pacíficos pelos direitos desses grupos? Como chamar de cristão alguém que frequenta as igrejas “cristãs”, pratica sacramentos e outras práticas litúrgicas, mas defende um candidato ou governante que prega  o ódio, a discriminação e a morte dos que pensam de modo diferente dele? Age de forma cristã uma igreja que usa as mídias, inclusive as de concessão pública, para promover tal tipo de candidato ou governante? Há hipocrisia maior do que essas? O que diria o Jesus de Nazaré, se aqui estivesse hoje, sobre tais pessoas e igrejas? É atitude cristã de uma igreja se omitir de denunciar a prisão política injusta do maior líder popular de nosso país, que com suas políticas públicas libertou milhões de pessoas da miséria e da fome? 

Para agravar mais ainda essa omissão, lembramos que os cristãos verdadeiros são seguidores de um preso político inocente, Jesus, que foi torturado, crucificado e assassinado, ao lado de dois ladrões, por autoridades sacerdotais e políticas de sua época. Por isso, sem ação permanente por mudanças nas estruturas de poder, na busca da ampliação da democracia solidária e ecológica com ampla e progressiva participação popular, não acontecem transformações  verdadeiramente evangélicas, inspiradas na práxis fraterna de Jesus de Nazaré. 

E isto vale para o Estado, a família, a sociedade organizada e as igrejas. 

Não podemos agir realmente como cristãos defendendo um valor  e praticando outro. Não podemos pregar a democracia e os direitos humanos nas estruturas da sociedade e do Estado e fazer o contrário  na igreja, no mercado, no nosso partido ou no nosso sindicato, ou mesmo na nossa família.  É o velho fermento da hipocrisia dos fariseus que Cristo tanto condenava. Como acreditar que uma instituição age de modo verdadeiramente cristão se ela não consegue respeitar os direitos humanos em sua organização interna?

Enfim, sem passar pela práxis humana do Jesus de Nazaré, o arquétipo do Amor Fraterno Pleno, não seremos companheiros do Jesus Cristo Ressuscitado! Só o Amor Fraterno Pleno nos salva do mal e da morte definitiva!

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