Pensar Piauí
Doutor em Antropologia

Arnaldo Eugênio

Doutor em Antropologia

Violência doméstica em tempos de pandemia

Foto: Blog Edson SilvaViolência Domética

 


Empiricamente, há relatos de aumento de casos de violência doméstica no Brasil durante a pandemia de coronavírus. Por um lado, se o isolamento social é uma recomendação preventiva de controle do COVID-19, por outro lado, o confinamento deixou muitas mulheres à mercê de agressores. É fato que, em inúmeros casos de agressões dentro do lar, especificamente contra mulheres, ocorrem porque os agressores querem subjugá-las e manter o poder (ou controle) e a maioria das vítimas desconhecem os seus direitos.

Conceitualmente, a violência doméstica é o abuso físico ou psicológico com base num padrão de comportamento que envolve violência ou outro tipo de abuso por parte de uma pessoa contra outrem num contexto doméstico – no caso de um casamento ou união de fato, ou contra crianças ou idosos. 

A violência doméstica está impregnada na sociedade e é quase invisível. Se manifesta através do “ciclo da violência”:

1º) na “tensão” – quando um casal perde a capacidade de diálogo;

2º) no “crescimento da tensão” – quando se perde o controle da relação; e

3º) na “explosão da violência”. Depois há um intervalo chamado “lua de mel” – quando o homem tenta reconquistar a mulher, pedindo desculpa, faz juras de amor, dá presentes e faz promessas. Isso impede que a mulher reflita sobre a violência. Quando se juntam novamente, ele não se vê correspondido e volta ao estágio da tensão.

Antes da pandemia de coronavírus estimava-se que, no Brasil, 2 milhões de mulheres – isto sem considerar as subnotificações – eram vítimas de violência doméstica por ano. Elas estão em todas as camadas sociais, possuem diversas profissões, etnia e níveis de escolaridade. Durante a pandemia de coronavírus, o confinamento em casa tem deixado muitas mulheres mais vulneráveis e expostas à violência doméstica.

Isso mostra que, a violência doméstica é um fenômeno sociocultural complexo. Pois, não é só bater, xingar, humilhar, impedir, ridicularizar, prender, chantagear, privar de alimento, dinheiro, saúde, obrigar a assinar documentos, matar etc. Ou seja, é fazer ou não fazer algo a uma mulher capaz de lhe causar morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.

O isolamento social é fundamental para o controle epidemiológico da pandemia de coronavírus, mas, também, associado a um conjunto de outros fatores deixa a vítima mais próxima do seu agressor, com poucas possibilidades de defesa e/ou de proteção aos filhos.

Primeiro, muitos agressores estão em casa consumindo álcool, sob estresse financeiro, sem planejamento doméstico, estado mental instável – p.ex. transtorno de ansiedade –, sem perspectivas, vida social limitada, discrepâncias de valores ou de interesses, o que tendem a produzir um relacionamento abusivo.

Segundo, a mulher não consegue sair de casa, enclausurada e com medo de sofrer violência maior não denuncia pelos telefones 180 ou 190, não se comunica com os vizinhos nem é vista em público, dificultando ainda mais a proteção social e o auxílio das forças de segurança.

Diante do contexto de isolamento social, em função da pandemia de coronavírus, urge uma ação conjunta dos poderes públicos e da sociedade civil organizada, para inibir a violência doméstica. Os poderes públicos podem dispor bases móveis de policiamento para monitoramento, denúncias e assistência social por áreas da cidade. E a sociedade pode contribuir com denúncias pelos telefones 180 ou 190. Afinal, a violência doméstica é um problema social, ético e moral de todos.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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