Pensar Piauí
Doutor em Antropologia

Arnaldo Eugênio

Doutor em Antropologia

"Anjos ou demônios", mais sobre abordagem a um lojista, no Parque Piauí

Foto: Parlamento PiauiPoliciais com falta de bom senso, habilidade funcional e comando hierárquico
Policiais com falta de bom senso, habilidade funcional e comando hierárquico

 

No século XIX, um ano após a chegada da corte lusitana de D. João VI, em 1808, a Polícia Militar que se conhece hoje surgiu das Forças Policiais. A primeira corporação é a do Rio de Janeiro – “Divisão Militar da Guarda Real de Polícia” (1809) –, cuja função era proteger a corte do povo, adotando o mesmo modelo de organização da guarda portuguesa (trajes, armas, estrutura militarizada, com companhias de infantaria e de cavalaria).

Desde então, a relação entre a polícia militar e o povo, no Brasil, sempre foi conflituosa, permeada de acusações, violências, mortes e tensões sociais. Talvez porque há tempos se insiste que a problemática da Segurança Pública é uma questão dos estados – das polícias estaduais –, com baixa participação e interferência do Governo Federal e nenhuma participação da sociedade.

Comumente, muitos apedeutas sociais balbuciam que “a população acha ruim a polícia, mas quando está em apuros só chama a polícia”. Claro, além da polícia militar, qual a outra instituição estatal está 24h próxima da população? Ou seja, as polícias militares, no Brasil, desde a origem são instrumentalizadas para proteger os ricos dos pobres. Covardemente, o Estado brasileiro usa as polícias militares para esconder a falta de assistência e proteção social e varrer o “lixo humano” nas periferias. Por isso, circunstancialmente, a polícia militar ora tem sua imagem relacionada a “anjos de luz”, ora a “demônios sanguinários”.

Numa recente abordagem a um lojista, no Parque Piauí, Zona Sul de Teresina, uma guarnição da polícia militar do Piauí protagonizou uma cena, no mínimo, truculenta e de repercussão nacional, quando estava acompanhando a fiscalização municipal  para o cumprimento dos decretos municipal e estadual, que estabelecem o fechamento do comércio e serviços não essenciais, em função da pandemia de coronavírus. 

Provavelmente, por falta de bom senso, habilidade funcional e comando hierárquico, 1) os policiais militares – ao invés dos fiscais municipais –, entraram na loja de roupas e solicitaram que o proprietário fechasse o estabelecimento; 2) o lojista iniciou uma discutir com os PMs; 3) o lojista se negou a assinar o Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) e foi algemado; e 4) a população e comerciantes locais se indignaram com a truculência policial.

Primeiro, cabe ao fiscal municipal fiscalizar, não os policiais. Não obstante, se o fiscal fosse agredido fisicamente pelo lojista, caberia voz de prisão pelo policial por ter uma vítima. Se aquele reagisse, resistisse ou desobedecesse, caberia o uso da força moderada e proporcional, para levá-lo à presença da autoridade policial, por desobediência e desacato. 
Segundo, a missão policial era acompanhar a fiscalização e manter a ordem (em caso de desordem), para tanto toda guarnição policial tem uma hierarquia de comando, justamente para evitar que um subordinado tome uma decisão privada. Portanto, a ocasião exigia mais bom senso, juízo e voz de comando do que truculência.Terceiro, a reação do lojista foi precipitada pelas atitudes privadas dos policiais sem um comando hierárquico. Ao invés de se esgotar as possibilidades de diálogo e convencimento se deixaram levar pela atmosfera de imprudência. Quarto, em meio ao estresse da pandemia de coronavírus, a população e os comerciantes locais reagiram à arbitrariedade e desproporcionalidade da ação policial em fazer cumprir a ordem.

Portanto, as cenas no Parque Piauí não eram “lives policiais” nem fato raro, não os tornam “anjos” nem “demônios”, mas ofusca a imagem da “gloriosa”.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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