Sede insaciável: enquanto pedem corte de gastos, parlamentares querem mais cadeiras (e mais verba)

Senado analisa projeto que eleva número de cadeiras na Câmara, apesar do discurso de corte de despesas

Em meio a discursos frequentes sobre a necessidade de ajuste fiscal e contenção de despesas públicas, o Senado Federal deve votar nesta quarta-feira (26) o Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 177/2023, que prevê o aumento do número de deputados federais a partir das eleições de 2026. A proposta, apresentada pela deputada Dani Cunha (União-RJ), amplia a composição da Câmara dos Deputados de 513 para 531 parlamentares — um acréscimo de 18 cadeiras.

Segundo a direção-geral da Câmara, a medida custará ao país R$ 64,4 milhões a mais por ano. O impacto orçamentário, porém, parece não incomodar tanto quanto outros gastos públicos que são alvos recorrentes de críticas quando envolvem políticas sociais ou reajustes do salário mínimo.

A justificativa para o projeto é uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou que a Câmara atualizasse a distribuição das cadeiras entre os estados com base nos dados do Censo de 2022. A Corte não ordenou aumento no número total de parlamentares, mas sim uma readequação proporcional — o que poderia significar a perda de assentos para estados que registraram redução populacional. O Congresso, no entanto, optou por ampliar o número de vagas, evitando assim desgastes políticos com cortes em bancadas estaduais.

Caso o projeto seja aprovado, os seguintes estados ganharão cadeiras:

Na prática, a proposta impede que estados com queda populacional percam representação — uma movimentação que revela o apego das bancadas ao próprio capital político. A alternativa, caso o projeto não avance até o fim de junho, será o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) definir a nova distribuição das cadeiras, o que pode resultar em perdas para algumas regiões, como o Nordeste.

O relator do projeto no Senado, Marcelo Castro (MDB-PI), defende a proposta como uma correção de distorções históricas. Segundo ele, a configuração atual da Câmara permanece inalterada desde 1986, mesmo com um crescimento populacional superior a 40%. Castro também alega que o Brasil segue como uma das democracias com menor proporção entre número de deputados e tamanho da população.

Ainda assim, o timing da proposta levanta questionamentos. Em um momento em que o próprio Congresso sustenta um discurso de austeridade fiscal, o aumento do número de parlamentares — e dos gastos — soa contraditório. A crítica se intensifica pelo fato de que os mesmos parlamentares que pregam cortes em áreas como educação, saúde e assistência social agora costuram acordos para ampliar a própria representatividade (e os próprios gabinetes).