Roda Viva transforma entrevista com Rafael Fonteles em palco de ataques velados ao PT

O programa pouco se interessou pela gestão do governador

Na noite de ontem (segunda-feira), o Roda Viva, tradicional programa de entrevistas da TV Cultura, teve como convidado o governador do Piauí, Rafael Fonteles (PT). A presença do político mais jovem entre os governadores brasileiros seria, em tese, uma oportunidade para discutir as transformações em curso no estado nordestino e o papel renovador de Fonteles dentro de seu partido. Mas o que se viu, na prática, foi outra coisa: um programa que pouco se interessou pela gestão do governador e muito se empenhou em reiterar uma pauta crítica — e por vezes enviesada — ao Partido dos Trabalhadores.

Sob o comando da jornalista Vera Magalhães desde 2020, o Roda Viva tem flertado com uma linha editorial que se pretende imparcial, mas que frequentemente resvala no desequilíbrio quando o assunto é o PT e seus representantes. No programa de ontem, esse viés ficou ainda mais evidente. Já na abertura, Vera escolheu enquadrar a entrevista dentro do contexto da suposta perda de popularidade do presidente Lula e da "falta de renovação de quadros" do partido — ainda que o próprio convidado fosse, ironicamente, um exemplo claro de renovação e de popularidade em alta.

A postura de Vera, marcada por interrupções constantes, ironias e insinuações desqualificadoras, dificultou o aprofundamento de temas relevantes relacionados à gestão de Fonteles. Um dos exemplos mais simbólicos foi quando ela minimizou os índices de aprovação de Lula, sugerindo que estariam "pouco acima de 60%". Coube ao governador corrigir a entrevistadora, mencionando a pesquisa mais recente que aponta uma aceitação superior a 70%.

O restante da bancada seguiu uma linha semelhante. Renan Sukevicius (BandNews FM) tentou reforçar a tese de que a esquerda brasileira não dialoga com os empreendedores, ignorando o próprio histórico do entrevistado, que se apresenta como um político com forte ligação com o setor produtivo. Julliana Lopes (CNN Brasil) insistiu na narrativa da divisão interna do PT, como se a convivência entre diferentes correntes ideológicas fosse uma anomalia e não uma característica de qualquer partido com base popular significativa. Ignorou ainda que o PT, historicamente, já compôs alianças amplas com figuras como José Alencar, Geraldo Alckmin e até Michel Temer.

Flávia Tavares (O Meio) tropeçou em sua tentativa de formular uma pergunta sobre as disputas internas do PT, misturando temas sem coesão, como regionalismo, liderança e sucessão partidária, em uma intervenção confusa e pouco informativa. Já Caio Sartori (O Globo) falou em "fadiga da imagem de Lula", apesar da ausência de dados concretos que sustentassem tal afirmação.

Josué Seixas (Folha de S. Paulo) foi outro a insistir na narrativa de que a reeleição de Lula corre riscos, desconsiderando pesquisas que mostram o presidente como favorito para 2026. Sua pergunta, como outras da noite, parecia brigar com os fatos.

Quando, enfim, o programa se voltou para o estado do Piauí, já passados 50 minutos, Vera Magalhães optou por destacar um episódio negativo — a quebra de contrato de uma empresa responsável pela instalação de banda larga — em vez de abrir espaço para discutir os avanços e políticas públicas conduzidas por Fonteles. Mesmo ao tratar do Consórcio Nordeste, a jornalista Flávia Tavares insinua que o grupo teria se tornado um apêndice do governo Lula, ignorando seu surgimento como reação à negligência do governo Bolsonaro.

Mais uma vez, o Roda Viva desperdiçou a chance de oferecer ao público uma entrevista construtiva, priorizando uma pauta voltada à desqualificação sutil — e às vezes nem tanto — de Lula, do PT e de seus aliados. Fonteles, por sua vez, demonstrou preparo, paciência e capacidade de responder às provocações com firmeza e dados concretos, revelando-se uma liderança dissonante da caricatura que parte da imprensa insiste em desenhar do PT.

Ao final, o que restou foi a sensação de que o programa, em vez de abrir espaço para o debate, armou um palanque inquisitório com pouca curiosidade jornalística e muito viés ideológico. E, ironicamente, acabou confirmando, por contraste, a força política de um governador jovem, articulado e em plena ascensão.

Veja a íntegra do programa: