PT vive uma crise geracional

O PT está também se masculinizando. Mais de 52% dos filiados são homens


Por Rudá Ricci, sociólogo

Eu tinha 17 anos quando ajudei a fundar o PT. Lembro de participar de panfletagens e ajudar nas barraquinhas de coleta de assinaturas para fundação do partido no centro de São Paulo, ao lado de Ana Corbisier. Os militantes antigos acolhiam os jovens com carinho, paciência e certa ironia. Lembro do carinho que recebia de Alípio Freire e Rita Sipahi, no auge do meu radicalismo juvenil.

O PT, no nascedouro, tinha este frescor da inovação. Jovens de idade e de cabeça ganhavam pleno espaço para falar, opinar, brigar e dirigir o partido.

Eu mesmo, do alto dos meus 20 anos, fui coordenador de subrregião no Estado de São Paulo e antes do 30 fazia parte do governo Erundina. Eu não era o único. Não éramos apenas filiados, mas dirigentes em formação.
Por este motivo que levo um susto com o nítido envelhecimento do PT. Embora tenha jovens vereadores assumam um lugar nas Câmaras Municipais, o comando e a base do partido envelhecem rapidamente. Pior: se compararmos com o número de jovens vereadores eleitos pela extrema-direita, o desespero aumenta.

Segundo dados do TSE de 2022, homens de meia idade são o principal perfil dos filiados a partidos. O PT não foge à regra: 19% dos filiados são homens de 45 a 59 anos de idade, índice similar ao do PCdoB. O índice cai para 14% no caso do PSOL. PSTU vai a 24%. O vigor da esquerda está se esvaindo pelos dedos neste século 21.

O PT está também se masculinizando. Mais de 52% dos filiados são homens.

Se cruzarmos o perfil etária com o sexo dos filiados, o cenário é pouco promissor. Mulheres de 18 a 24 anos não chegam a 1% dos filiados do PT. Já os homens nesta faixa etária não perfazem mais que 0,5% dos filiados petistas. Quase 42% dos homens filiados petistas têm entre 35 e 69 anos (17% dos filiados homens têm de 60 a 74 anos).

30% da população brasileira tem entre 18 e 24 anos. No PT, são menos de 2% dos filiados. A diferença é abissal. Não é representativo.
A direção do PT lançou um informe revelando que nas eleições municipais de 2024, o PT lançou 111 candidatos com até 35 anos às prefeituras, dos quais 33 foram eleitos. Ocorre que representam 13% apenas dos prefeitos petistas eleitos. Entendo perfeitamente que uma direção tem que incentivar e orientar. Mas, parece que é hora para parar de falar pela batuta do marketing eleitoral e voltar a falar como direção racional que não teme abrir um amplo debate como ocorreu com o Manifesto dos 113 após a derrota eleitoral de 1982.
Há um incômodo em relação à eleição de "herdeiros políticos": filhos, sobrinhos, netos de figuras históricas do PT. Tal situação pode revelar a cristalização de estruturas de poder interno que estaria dificultando realmente a renovação de quadros de comando partidário.
Robert Michels escreveu um livro que até hoje é uma referência mundial sobre estudos partidários a respeito da a "lei de ferro da oligarquização" de partidos operários. Michels foi militante da ala mais à esquerda do Partido Socialista Italiano e era associado ao sindicato rivoluzionario. Na sua visão, haveria uma tendência à elitização no comando da socialdemocracia alemã.

O lulismo tende a reforçar a lógica parlamentar e, assim, cristalizar direções já institucionalizadas, dificultando a ascensão de lideranças sociais e de base na estrutura de mando do partido. As federações partidárias alimentam ainda mais esta situação.

As campanhas eleitorais deste século estão muito mais caras, com imensos volumes de dinheiro em marketing e impulsionamento nas redes sociais. Evidente que os mais ricos e já estabelecidos na política ou no comando partidário têm mais acesso a recursos.
Enfim, esta campanha colocou de vez o emperramento e envelhecimento das esquerdas brasileiras, com o PT à frente do bloco de centro-esquerda. Como pouquíssimos municípios enfrentam um segundo turno, chegou a hora de debatermos este fenômeno.