O treze de maio e a forma social escravista no Brasil

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O treze de maio e a forma social escravista no Brasil

Uma data nacional a não se comemorar, principalmente se o seu histórico familiar lhe impregna pela tradição da importância do elemento negro na formação do povo brasileiro. O ato simbólico da Princesa Isabel revestiu-se na revogação estrutural da escravidão negra no Brasil, porém a sua institucionalidade nunca foi revogada, às vezes mitigada nas obras dos intérpretes de nossa brasilidade.

Passados vinte e cinco anos da morte de meu pai, Gilberto Madeira, não esqueço de seus esforços e reforços para que eu fosse um homem com personalidade forjada na luta pela honradez do povo negro. Aprendi com ele, um operário e também contador de histórias e estórias (dos bons), rudimentos de cidadania, razão pela qual fui impulsionado a estudar filosofia e economia.

A partir destes impulsos compreendi o peso do racismo na sociedade brasileira e o “não lugar” de negros, indígenas, pardos, mulatos e mestiços na sociedade brasileira. Aos poucos fui colecionando saberes de intelectuais do porte de Alberto da Costa e Silva (filho do poeta Da Costa e Silva), diplomata e meu conterrâneo ao deixar-me orgulhoso quando na revelação que, mesmo em diáspora, os negros transpuseram para o Brasil duas grandes tradições: a criação de gado e a fundição de metais (ouro e prata).

Neste sentido, o povo negro deveria ser reconhecido como responsáveis diretos pela formação econômica brasileira. Quando falo de povo negro, compreenda-se também toda a mestiçagem tupiniquim. Ao longo da existência da escravidão negra no Brasil, período colonial e período imperial, para a maioria do povo (escravizados) a cidadania foi em negativo. Tal fato foi a apontado pelo historiador José Murilo de Carvalho ao descrever os caminhos da cidadania no Brasil. Neste longo período, o elemento negro foi privado dos três diretos de cidadania apontado pela sociologia política: civis, políticos e sociais. 

Mesmo com a abolição da estrutura legal da escravidão e o anúncio prévio de Joaquim Nabuco de que a ferida da escravidão demoraria muitos anos para cicatrizar, perdura no Brasil um gap social e econômico para os que foram escravizados. Não existem leis econômicas racistas, mas existem formas de discriminar as pessoas pela cor da pele (ligando a cor preta à escravidão). As estatísticas provam que os mais pobres são negros e pardos, os que mais morrem por violência urbana e rural é a juventude negra. Portanto, o crescimento e o desenvolvimento econômico não são para a população no geral.

Eu poderia passar o artigo inteiro pontuando questões que contestam o mito da democracia racial desenvolvido no Brasil, a partir de Gilberto Freyre, e em citações de Guerreiro Ramos a Clóvis Moura (também meu conterrâneo piauiense). Mas, dou-me por satisfeito em informar que neste 13 de maio repito a minha não comemoração à abolição da escravidão pela Lei Áurea (1988) com mais convicção e ardor encorajado pela publicação recente (março de 2023) do mais recente livro de Muniz Sodré: O fascismo da cor (pela editora vozes).

A referida obra é uma radiografia do racismo nacional e representa uma nova perspectiva dentro da luta antirracista. O esforço intelectual de Muniz Sodré expõe um longo tempo pós-abolicionista de permanência de uma ‘forma social escravista’ nativa, em que status e brancura tomam o lugar das antigas formas de segregação”. 

Neste 13 de maio, eu o comemoro com a mesma negação. Meu orgulho de negro consciente não vai esperar o dia 20 de novembro. Já me sinto contemplado pelos ensinamentos de Muniz Sodré (81 anos):  um dos mais influentes pesquisadores da comunicação no Brasil e também um dos obás de Xangô, espécie de ministros do Ilê Axé Opô Afonjá, um dos mais antigos terreiros de candomblé de Salvador.

Um salve para Ogum, meu orixá guerreiro!