Marçal pisou no tomate. A reação pode vir de seu próprio campo

Candidato pode ter assinado sua carta de saída do pleito ao apresentar falso laudo sobre Boulos

Por Gilberto Maringoni, professor, no facebook

1. PABLO MARÇAL DEU UMA CARTADA tão brutal quanto tosca ao divulgar o falso laudo médico sobre Guilherme Boulos cerca de 30 horas antes do início das votações no domingo. A difusão nas redes da extrema-direita é intensa e instantânea. Na madrugada de sexta para sábado é difícil mensurar os prejuízos que a iniciativa pode causar à candidatura de seu oponente. A resposta da equipe de Boulos foi imediata e se desdobra por duas vias, uma política e outra jurídica.

2. O EX-COACH PODE TER cometido aqui um erro crasso. Ele não se dá em especial por divulgar a grosseira falsificação de um diagnóstico de saúde, logo desmascarado. Sua pisada na bola maior parece ter sido a de subestimar a disputa que trava nos marcos de seu próprio campo.

3. MARÇAL NÃO CONCORRE à vaga de sucessor do chefe no interior do bolsonarismo, corrente política ainda não de todo consolidada. O maior sinal da fragilidade dessa vertente é não ter logrado ainda constituir um partido político bolsonarista. Talvez seja mais correto dizer que Jair Bolsonaro captou e surfou numa onda conservadora na sociedade, que tende ao fascismo. O universo de disputa é a extrema-direita, na qual se inserem Bolsonaro, Marçal e respectivas turmas.

4. ASSIM, É INCORRETO achar que Marçal está para Bolsonaro, assim como Boulos está para Lula. O psolista almeja ser o sucessor do presidente da República no interior do lulismo, em acordo com seu patrono. O lulismo é mais um espaço político criado ao redor do líder e de seu partido, do que uma tendência política de contornos nítidos. O bolsonarismo é mais definido política e ideologicamente, mas não tem a organicidade e o peso histórico do lulismo.

5. MARÇAL DISPUTA a primazia na extrema direita, em oposição a Bolsonaro e a seus seguidores. Isso faz toda a diferença. Por sua baixa organicidade, setores da base bolsonarista se descolam do líder e rumam para o campo gravitacional de Marçal. E o bolsonarismo mostra sua precariedade orgânica.

6. DAÍ VEM A VIOLENTA REAÇÃO do ex-presidente contra Marçal na manifestação de 7 de setembro, na Paulista. Daí vem o fato de Bolsonaro hesitar em definir apoio claro a um dos dois candidatos extremistas que se enfrentam em São Paulo, ao mesmo tempo em que sua base migra para as águas do postulante goiano.

7. NESSE PONTO, VOLTAMOS AO POSSÍVEL ERRO de Marçal. Para a consolidação do bolsonarismo, é vital cortar as asas de qualquer demonstração de autonomia no interior da extrema-direita. Assim deve ser entendida a violenta reação de Silas Malafaia ao falso documento médico divulgado por Marçal. “Esse bandido tem que ser preso”, escreveu o pastor em suas redes. “O psicopata do Pablo Marçal forjando documento contra Boulos para dizer que ele é dependente de drogas. Inadmissível! Não é porque Boulos é o nosso inimigo político que vamos aceitar uma farsa dessa”.

8. É POUCO PLAUSÍVEL QUE UMA FIGURA como Malafaia esteja moralmente indignado com Marçal. O mais provável é ele ter visto ali um flanco aberto – pela tosquice e total mentira da história – para desferir um golpe em cima do do concorrente. A intenção de Malafaia, de Bolsonaro e de sua trupe é impedir qualquer dissenção com potencial de se tornar incontrolável em seu cercadinho.

9. MESMO QUE VENHA A SER PRESO, o nome do ex-coach seguirá nas urnas. Não há tempo hábil para retirá-lo e – repito – não se sabe do avanço nas intenções de voto que Marçal possa ter obtido. Mas sua briga mais séria se dará com os supostos donos da franquia neofascista no Brasil, que não admitem contestação. Ainda mais dentro de suas próprias quatro linhas.