Histórico discurso de Lula (mais um) na Cúpula da CELAC e os recados a Donald Trump

Em Honduras, presidente brasileiro explica o que está por trás do tarifaço de Trump e defende maior integração dos países latino-americanos e caribenhos

Nessa quarta-feira (9), durante a abertura da 9ª Cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), em Tegucigalpa, capital de Honduras, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um discurso histórico e mandou recado incisivo contra o tarifaço anunciado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em especial contra a China. Sem citar diretamente o nome de Trump, Lula criticou a decisão do governo estadunidense e classificou a medida como uma tentativa de enterrar o multilateralismo e fomentar o confronto global.

“Tarifas arbitrárias desestabilizam a economia internacional e elevam os preços”, afirmou Lula. “A história nos ensina que guerras comerciais não têm vencedores”, disse, ao alertar para os riscos de a América Latina voltar a ser tratada como “zona de influência” diante da nova geopolítica que se desenha.

Em outro momento da Cúpula, Lula foi ainda mais direto ao comentar a notícia de que os Estados Unidos haviam aplicado uma tarifa de 125% sobre produtos chineses. “O que está por detrás disso? É colocar fim ao multilateralismo e tentar fazer as negociações individuais. É o protecionismo elevado às últimas consequências”, criticou.

O presidente brasileiro defendeu que, diante de uma escalada protecionista por parte dos EUA, os países latino-americanos devem fortalecer os laços econômicos e políticos dentro da região. “Quanto mais fortes e unidas estiverem nossas economias, mais protegidos estaremos contra ações unilaterais”, disse, destacando que o comércio do Brasil com os países da CELAC já supera o realizado com os EUA e se aproxima do nível alcançado com a União Europeia.

Lula reforçou ainda que a estratégia dos EUA põe em risco a estabilidade global. “Me parece que está ficando cada vez mais visível que é uma briga pessoal com a China”, afirmou. “Não é aceitável a hegemonia de um país – nem militar, nem cultural, nem industrial, nem tecnológica e nem econômica – sobre os outros”, completou.

“Reciprocidade” e unidade regional

Questionado por jornalistas sobre a postura que o Brasil adotará diante do endurecimento tarifário, Lula deixou claro que haverá reação: “Vamos utilizar todas as palavras de negociação que o dicionário permitir. Depois que acabar, nós vamos tomar as decisões que entendermos serem cabíveis”, disse.

Na cúpula, Lula também aproveitou para propor uma agenda de fortalecimento institucional e comercial da região, com destaque para a reativação do Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos da ALADI e a ampliação do Sistema de Pagamentos em Moeda Local.

Segundo ele, “integrar redes de transporte, energia e telecomunicações reduz distâncias, diminui custos e incentiva sinergias entre cadeias produtivas”. O presidente reforçou que a integração não pode mais ser adiada por divergências ideológicas. “É chegada a hora de enfrentar o debate sobre a regra do consenso. Ela tem gerado mais paralisia do que unidade”, apontou.

Propostas e recados

Entre os temas centrais de sua fala, Lula destacou três eixos de cooperação regional: defesa da democracia, combate às mudanças climáticas e integração econômica. Também propôs uma candidatura unificada de uma mulher latino-americana ou caribenha para o posto de secretária-geral da ONU em 2026 — o que, segundo ele, pode ser um passo importante para resgatar a credibilidade da organização.

Sem meias palavras, o presidente brasileiro deixou claro que a América Latina precisa ser protagonista de seu destino. “Não queremos guerras nem genocídio. Precisamos de paz, desenvolvimento e livre comércio. O multilateralismo é abalado cada vez que silenciamos ante as ameaças à soberania dos países da região”, declarou.