Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, está no centro de um dos mais controversos episódios de sua gestão. Em um movimento descrito como ilegal e antitransparente, ele liderou uma manobra que altera profundamente a destinação das emendas parlamentares e ignora decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). A ação inclui a criação de um novo mecanismo – as "emendas dos líderes" – para camuflar a origem de bilhões de reais em recursos públicos.
O plano foi articulado em parceria com 17 líderes partidários da Câmara, entre eles o líder do governo Lula, José Guimarães (PT-CE), e Hugo Motta (Republicanos-PB), apontado como sucessor de Lira. A operação começou com a aprovação da Lei Complementar nº 210, que previa que as emendas de comissão poderiam ser indicadas pelos líderes partidários, mas exigia aprovação e publicação em atas pelas comissões permanentes da Câmara. Contudo, Lira suspendeu o funcionamento dessas comissões entre 12 e 20 de dezembro, impedindo qualquer deliberação.
Na sequência, um ofício sigiloso foi enviado ao governo com 5.449 indicações de emendas, totalizando R$ 4,2 bilhões. Embora apresentado como ratificação de propostas anteriores, o documento inclui R$ 180 milhões em “novas indicações” e alterações de R$ 98 milhões, favorecendo, em sua maioria, Alagoas – estado de origem de Lira. Esse movimento desafia não apenas o rito exigido pela legislação, mas também decisões do STF que proíbem o sigilo nas emendas e determinam que cada deputado seja identificado como autor de suas indicações.
Entre as ilegalidades identificadas, destacam-se:
Desrespeito à Lei Complementar nº 210: As emendas deveriam ser aprovadas e registradas em atas pelas comissões, o que foi inviabilizado pela suspensão determinada por Lira.
Informações falsas: O ofício sigiloso afirma que as indicações foram apenas ratificadas, mas inclui novas alocações, o que é proibido sem a aprovação das comissões.
Favorecimento político: Alagoas, representado por Lira, recebeu mais de 11% das emendas de comissão (R$ 479,7 milhões), além de liderar entre as “novas indicações”.
Omissão da identidade dos parlamentares: O ofício coletivo impede a identificação dos deputados responsáveis pelas indicações, violando normas do STF e do governo federal.
Essa manobra também resultou na exclusão de obras já empenhadas em regiões que não compõem a base de apoio de Lira, como Coribe (BA), reduto do deputado José Rocha, desafeto político do presidente da Câmara. Ações como essa reforçam o caráter político e retaliatório do esquema.
O consultor legislativo Fernando Moutinho classificou as ações como violação direta da legislação orçamentária e das decisões judiciais. Para ele, a responsabilidade também recai sobre o Executivo, que deveria barrar a execução de recursos sem conformidade legal.
Apesar das irregularidades, a Secretaria de Relações Institucionais do governo afirmou que a execução das emendas tem respeitado as decisões do STF e os regulamentos federais. Contudo, as decisões da Câmara sob Lira representam um desafio direto à transparência e à governança pública, ampliando as sombras do chamado “orçamento secreto”.