Direita tenta enredar Haddad para abraçá-lo como terceira via em 2026

O plano, se não estou vendo de binóculos, é deixar claro que Fernando Haddad será muito bem-vindo e apoiado se topar fazer o “meio de campo”

Por Denise Assis, jornalista, no247  

Não foi puramente um perfil. Muito menos uma entrevista. Foi, isto sim, uma teia em que o ministro Fernando Haddad se deixou cair. Justo numa semana em que ele estava fragilizado, conforme deixou escapar em uma entrevista quebra-queixo (quando os jornalistas cercam o entrevistado com os seus celulares na mão). “Estou me sentido muito só”, chegou a comentar.

Não era para menos. Aquela era mais uma das muitas semanas em luta com a Câmara e o Senado, em busca de manter a sua agenda econômica dentro das suas previsões. Tal como o lobo das histórias infantis, sempre à espreita de suas presas, o jornalão aproveitou para uma investida e Haddad, como um “Chapeuzinho Vermelho”, caiu. A direita, que novamente vê o tempo escoar sem que seja possível fabricar um nome palatável para 2026, tentou capturá-lo na barriga do lobo sem deixar margem ao mínimo das desconfianças de Chapeuzinho: para que essa boca tão grande? Teria perguntado a menina. O ministro não. Entregou alma e coração, como um cachorrinho que despencou da mudança. O primeiro que lhe passou a mão na cabeça, levou. 

O cenário das eleições municipais de São Paulo, que se apresenta cada vez mais como um ringue preparatório para as majoritárias, desenha um quadro em que Bolsonaro dá as cartas, levando não o seu partido para o centro, conforme tem tentado demonstrar, mas ele, sim, tem mantido o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), na ultradireita. A situação ficou clara na escolha ao cargo de vice na chapa de Ricardo Nunes à reeleição. O perfil de Ricardo Mello Araújo, ex-integrante da temida ROTA - a Polícia Militar ostensiva -, foi imposto por Bolsonaro (PL) e ninguém tem dúvida sobre o que Mello pensa dos 54 mortos pelos companheiros de farda, na Baixada Santista, sob o comando do governador, por exemplo.

Desta forma, antes que Lula se torne uma opção irreversível, o jornalão bate com força no presidente, enquanto açula Fernando Haddad. Essa era hora de recolhimento, mas como os “fragilizados” às vezes deixam a carência suplantar a racionalidade... É o momento em que o campo oposto aproveita para agir. Assim, Haddad não só aceitou ser entrevistado no pretensioso perfil semanal - traz em cima o selinho: “tem que ler” -, como o texto foi todo conduzido como uma rede de intrigas, onde a palavra predominante é: “isolado”. Fica nítida a intenção de demonstrar que na direita ele ganha colo. No partido, não.

Desde quando descreve a sua passagem pela prefeitura paulista: “Conseguiu negociar a dívida do município e conquistou o grau de investimento para a cidade. Ainda assim, saiu sob críticas gerais, principalmente do PT”; até a descrição do seu estilo: “Isolado é a palavra que o acompanha, embora ele seja a pessoa que atravessa a rua para falar com os possíveis aliados”, importante é deixar claro a Haddad: você não está entre os seus. No tom que lembra propaganda da CEF: “vem pra Caixa você também”, é visível o esforço de atrair o ministro para o centro, para os braços daqueles que o tratarão bem: os amigos do mercado.

O plano, se não estou vendo de binóculos, é deixar claro que Fernando Haddad será muito bem-vindo e apoiado se topar fazer o “meio de campo” enquanto eles tentam enfraquecer o Lula. Para isso, tome de futrica. “Com Lira, o entendimento tem sido surpreendentemente bom. Fora uma ou outra rusga, o diálogo é fácil e direto”. (...) “De Gleisi Hoffmann, sofreu a primeira derrota antes ainda de assumir o Ministério da Fazenda”. E prossegue lembrando que foi a presidente do partido quem anunciou na GN que o imposto de combustíveis eliminado com fins eleitoreiros por Bolsonaro, não voltaria a vigorar logo, a fim de manter a popularidade do governo, quiseram explicitar. “Haddad foi derrotado, e a presidente do partido anunciou a decisão de que o imposto não voltaria numa entrevista ao Estúdio I”.

Importante espalhar a má vontade com o ministro Haddad pelas várias instâncias do governo. “Um ponto óbvio de atrito é que o chefe da Casa Civil está sempre reclamando das restrições orçamentárias para as obras do PAC”. E nenhuma intriga estaria completa se não incluísse uma maledicência contra o presidente Lula: “Em 2018 Lula era candidato, estava preso e tentava na Justiça o direito de concorrer. (...) Mas Lula só desistiu da candidatura quando faltava uma hora para o fim do prazo”. E apimenta: “Foi uma campanha cruel, em que ele, indicado na última hora, não tinha autonomia para tomar decisões – disse uma pessoa que acompanha a carreira de Haddad”.

Completada a rede de intrigas, vem a receita do bolo, para que Fernando Haddad siga prestigiado e um nome no cast de candidatos para 2026: “Aprendeu em 2018, que, para cruzar o mar vermelho, em tempos de extrema direita, tem que costurar alianças”. Ou seja: atravesse, e abandone o vermelho que, se você ficar rosinha, nós abrimos os braços para você, com açúcar e com afeto.