Dilma e Lula constroem o mundo multipolar, silenciado pela mídia comercial

A despeito da tentativa de silenciamento promovida pelos meios de comunicação, os BRICS avançam nos encontros do Rio de Janeiro

Por Leonardo Attuch, jornalista, 247 

Na manhã desta sexta-feira 4, no primeiro dia do décimo Encontro Anual do Novo Banco de Desenvolvimento, um pesquisador da Universidade de Tsinghua, que eu eu havia conhecido dois dias antes num jantar promovido por um think-tank chinês, me questionou por que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, presente no hotel Fairmont, local da conferência, estava sendo cercado pela imprensa brasileira num dos coffee-breaks.

Mesmo sem falar português, ele intuiu que a imprensa brasileira parecia mais interessada na agenda doméstica do que nos temas discutidos no encontro, como a construção de uma nova ordem financeira internacional e de novos mecanismos de cooperação entre as nações do Sul Global

E foi exatamente isso que eu respondi a ele: controlada pelo capital financeiro, a mídia brasileira é regida pela lógica da austeridade fiscal e do neoliberalismo – que é política econômica determinada pelo Norte Global aos países do Sul Global. 

É uma lógica totalmente diferente do ecossistema midiático da China, em que predomina a comunicação pública. No Brasil, onde bilionários e financistas controlam os meios de informação, temas como BRICS, ascensão do Sul Global, Novo Banco de Desenvolvimento e multipolaridade são silenciados, mesmo quando uma cúpula tão importante ocorre no Rio de Janeiro.

Enquanto a cobertura da mídia brasileira se voltava para o tema da austeridade e pautas paroquiais, a presidenta do NDB, Dilma Rousseff, fazia um discurso extremamente relevante. Logo no início de sua fala, ela deixou claro o significado político da criação do banco há uma década: “Foi uma declaração política de intenções e de práticas. Uma afirmação de que os países do Sul Global deixariam de ser receptores passivos de modelos de crescimento impostos e passariam a ser arquitetos do seu próprio futuro.”

Dilma apontou a originalidade do NDB, com sua governança horizontal e modelo inclusivo: “Nenhuma voz é silenciada, nenhum país domina.” E prosseguiu: “O desenvolvimento deve ser sustentável, inclusivo, justo, resiliente e soberano.” Ou seja, uma ruptura com as condicionalidades impostas por instituições como o FMI e o Banco Mundial, verdadeiras correias de transmissão do imperialismo financeiro.

Ela foi ainda mais longe ao denunciar o cenário global: “Tarifas, sanções e restrições financeiras estão sendo usadas como ferramentas de subordinação política.” Em contraste, propôs que o NDB atue como plataforma de cooperação, investimento em infraestrutura e transição energética, fortalecendo moedas locais, ampliando parcerias e apoiando países com baixa capacidade institucional. 

Logo em seguida, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva escancarou o fracasso da ordem econômica estabelecida após a Segunda Guerra Mundial  e fez uma crítica contundente ao dogma neoliberal: “O modelo da austeridade não deu certo em nenhum país do mundo. Toda vez que se fala em austeridade, o pobre fica mais pobre e o rico mais rico.” Ao destacar o potencial do NDB como alternativa real, Lula foi incisivo: “Vocês podem e devem mostrar ao mundo que é possível criar um novo modelo de financiamento, sem condicionalidades.”

Os discursos de Dilma e Lula, que ressoam globalmente como a defesa de uma ordem multipolar justa, seguem invisibilizados na mídia corporativa brasileira – e o silêncio é deliberado. Os grupos de comunicação que pretendem moldar a opinião pública no país pertencem a famílias e fundos alinhados ao capital financeiro internacional. Eles têm lado — e, definitivamente, não é o lado do Sul Global.

Curiosamente, a história narrada neste artigo ocorre num momento em que há uma tomada de consciência, pela esquerda brasileira, sobre o papel nefasto exercido pelos meios de comunicação privados, que saíram em defesa da política de austeridade, quando o governo Lula decidiu abraçar a causa da taxação dos super-ricos – o que, por sinal, foi o tema central da fala do ministro Haddad no encontro do Novo Banco de Desenvolvimento.

Neste caso, a tentativa de silenciamento não foi bem-sucedida. Segundo levantamento da Quaest, a esquerda não apenas venceu o debate político nas redes sociais, como também derrotou o discurso dos meios de comunicação hegemônicos sobre a questão fiscal.

No encontro do Novo Banco de Desenvolvimento, Dilma e Lula apontaram um caminho possível: o de um mundo com múltiplos centros de poder, menos submetido à lógica do capital financeiro e mais atento à justiça social, à soberania e à sustentabilidade. Um projeto que avança de forma consistente, ainda que seja silenciado pelos meios de comunicação de um passado decadente. 

Neste novo mundo em construção, cabe aos movimentos sociais, aos veículos independentes e às redes digitais assumir a missão de mostrar que outra ordem global é possível – e já está sendo construída