Piauí - Um grupo de políticos e empresários, a maioria ligada ao setor de transporte de Minas Gerais, e seus familiares, tomou na terça-feira, dia 23, a primeira das duas doses da vacina da Pfizer contra a Covid-19, em Belo Horizonte. Eles compraram o imunizante por iniciativa própria e não repassaram ao SUS (Sistema Único de Saúde), como prevê a lei. A segunda dose está prevista para ser aplicada nas cerca de cinquenta pessoas daqui a trinta dias. As duas doses custaram a cada pessoa 600 reais.
A revelação foi feita pela jornalista Thais Bilenky em reportagem publicada nesta quarta-feira (24) na Revista Piauí. Segundo a matéria, entre os beneficiados está o ex-senador Clésio Andrade (MDB), ex-presidente da Confederação Nacional do Transporte (CNT).
Andrade confirmou à Piauí que usufruiu das doses ilegais.“Estou com 69 anos, minha vacinação [pelo SUS] seria na semana que vem, eu nem precisava, mas tomei. Fui convidado, foi gratuito para mim”, declarou.
O Congresso aprovou há cerca de vinte dias um projeto de autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que autoriza a compra de vacinas pela iniciativa privada, mas determina que todas as doses devem ser doadas ao SUS até que os grupos de risco – 77,2 milhões de pessoas, de acordo com o Ministério da Saúde – tenham sido plenamente imunizados em todo o país. O Brasil vacinou menos de 15 milhões de pessoas até agora.
Mesmo depois da imunização dos grupos prioritários, as vacinas compradas pela iniciativa privada devem ser divididas meio a meio com o SUS, numa operação fiscalizada pela pasta.
O deputado federal Alencar da Silveira (PDT-MG) também estaria entre os vacinados, segundo pessoas presentes na vacinação. Ele, no entanto, negou.
A Pfizer não comentou sobre o caso.
Além de estarem sendo vacinados em período irregular – durante a imunização do grupo prioritário -, os envolvidos não repassaram metade das doses ao Sistema Único de Saúde (SUS). A compra de doses para vacinação privada só é permitida após a imunização de todo o grupo prioritário.
O esquema dos sinhozinhos com a Pfizer
Por Moisés Mendes, no DCM
Sabemos de espertalhões que furaram as filas da vacinação no Brasil e em muitos países. Os argentinos enfrentaram o constrangimento de ver um governo de esquerda em que o ministro da Saúde (já demitido) vacinava um grupo de elite de autoridades, conhecidos, amigos e protegidos.
Mas o Brasil passou à frente de todos mais uma vez com a denúncia da revista Piauí de que aqui há endinheirados comprando vacina da Pfizer. É uma forma inédita de furar fila.
Não há notícia em nenhum outro país de políticos e empresários que tenham tomado a iniciativa de comprar a vacina para imunizar parentes e amigos.
Aconteceu com um grupo de políticos e empresários da área de transportes de Minas Gerais. Eles pagaram R$ 600 pelas duas doses para um grupo de 50 pessoas. Gastaram R$ 30 mil.
Os organizadores do esquema de fura-fila foram os irmãos Rômulo e Robson Lessa, donos da viação Saritur. A vacinação aconteceu em uma garagem do grupo.
A Piauí diz que o ex-senador Clésio Andrade, ex-presidente da Confederação Nacional do Transporte (CNT), foi um dos vacinados, porque teria ganho a vacina de presente. A segunda dose está prevista para daqui a 30 dias.
Pela lei, os bacanas só poderiam ter comprado a vacina se essas fossem depois doadas ao SUS. Deveriam doar tudo até que os grupos de risco – em torno de 77 milhões de pessoas – tivessem sido vacinados.
Depois da vacinação desses grupos, a iniciativa privada deve dividir os estoques comprados ao meio, para a turma deles e para o SUS. O SUS deve ficar com a metade.
Mas agora não poderiam ter feito o que fizeram, porque menos de 20% das pessoas dos grupos de risco foram vacinadas.
Alguém pode pensar: mas quem tem dinheiro vai ao mercado e compra a vacina. Não é bem assim.
Não dá pra concordar que, num mundo em que todos os países querem vacinas, os que têm dinheiro possam chegar aos imunizantes antes dos governos.
A vacinação é um esforço mundial de saúde pública. Os empresários deveriam lutar para que todos tenham acesso às vacinas. Mas fizeram o que para eles é mais fácil.
Os sinhozinhos cometeram um delito. E não estão sozinhos. A Pfizer deve ser investigada, porque também descumpriu compromissos de protocolos mundiais. Os governos devem ser atendidos antes.
É uma de tentativa de equidade num cenário de guerra, em nome do bom senso e do humanismo, mais do que uma regra que nem precisa ser escrita. A Pfizer patrocinou a atitude egoísta dos bacanas brasileiros ao permitir que comprassem a vacina.
Teremos explicações esdrúxulas, que não irão convencer ninguém. Não esperem punição. A casa grande ainda existe no Brasil. O genocídio tem cúmplices, por adesão ou omissão, em todas as áreas.