Eu sempre digo, os moradores de rua não são anjos nem demônios, são pessoas. Alguns deles são terraplanistas, alguns deles são machistas, são homofóbicos, são racistas. Eles também são atingidos pela grande mídia, pelo pensamento dominante. Eles também pensam o que todo mundo pensa. Não é porque eles estão na rua, que eles são diferentes. Eles são diferentes do ponto de vista da desigualdade. Mas a ideologia dominante é a mesma. A mesma novela que você assiste, eles assistem. O mesmo jornal que você lê, eles leem. O mesmo apresentador que fala aquilo que o povo tem que pensar, eles ouvem também. Eles não têm uma rádio alternativa deles. Eles pensam o que todo mundo pensa. Se você não convive, você não conhece. Se você não convive, você não ama. Nenhum de nós é só uma coisa. Você não é só o que eu tô vendo. Eu não sou só o que você tá vendo.
Padre Júlio Lancelotti
É certo que o leitor e a leitora deste texto, passando em seu veículo, ou no transporte público, já tenha visto alguma pessoa em situação de rua, que aumentou 100% nos últimos três anos, de acordo com dados da Pastoral do Povo de Rua divulgados em fevereiro deste ano.
É certo que, os moradores e frequentadores da zona Sul de Teresina ao passar pelo viaduto da Avenida Higino Cunha puderam reparar uma enorme construção na calçada da avenida Castelo Branco. Telhas de zinco, paletes, caixotes de madeira e papelão fazem a moradia de um ser humano. Lá reside Carlos Henrique, um homem que fez da rua seu endereço há 10 anos.
Um fato drástico mudou toda a vida de Carlos, atualmente com 55 anos. Apesar de documentado pela institucionalidade pública, o pensarpiauí, numa medida de precaução , não revelará a dramaticidade que marcou definitivamente a vida de Carlos Henrique.
Natural da cidade de Parnaíba, ele chegou em Teresina ainda criança e morou durante toda a vida no bairro Santa Clara.
Seu nome e idade foi tudo o que conseguimos extrair de informação dada pelo próprio personagem de nossa história. Desconfiado, Carlos Henrique partiu com seu chapéu de palha para o outro lado da rua e de lá não saiu até o momento em que nossa reportagem deixou o local.
Uma pessoa trabalhadora
O pensarpiauí conversou com alguns trabalhadores da região para ouvir seus relatos sobre Carlos Henrique. Descrito como uma pessoa “tranquila” e que “não foge do trabalho”, ele é tido como esforçado e ativo.
Realiza uma série de “bicos”, como trabalhos de limpeza feitos nos comércios que circundam sua casa na calçada, mas sem receber dinheiro como pagamento de seus serviços. Sua única pedida é por comida e um abrigo, um pouco mais seguro, quando o período do inverno se torna mais intenso.
Carlos Henrique tem 11 filhas, mas não recebe nenhuma visita. Desconfiado, ele não dialoga com a imprensa, tampouco com serviços de saúde e social que tentam se aproximar do local.