Bolsonaro transforma UTI em palco de confronto contra a Justiça, reluta, mas assina intimação do STF

O Brasil foi novamente obrigado a assistir ao teatro grotesco do réu do STF

Internado desde o dia 12 de abril no hospital de luxo DF Star, em Brasília, após uma cirurgia de 12 horas para tratar aderências intestinais, o ex-presidente Jair Bolsonaro mais uma vez demonstrou que a liturgia do cargo nunca o alcançou — nem mesmo fora dele. Nesta quarta-feira (23), o Brasil foi novamente obrigado a assistir ao teatro grotesco protagonizado por aquele que, mesmo hospitalizado, insiste em travestir suas obrigações legais em espetáculo político.

A oficial de Justiça enviada ao hospital, por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), teve que enfrentar não só o próprio Bolsonaro — agora réu por tentativa de golpe de Estado —, mas também uma tropa de fanáticos que se reveza ao redor de seu leito como se este fosse o altar de um messias em desgraça. O motivo da visita: entregar a citação da ação penal que o ex-presidente e seus aliados tentaram transformar em mais um capítulo da sua narrativa persecutória.

A justificativa para a intimação hospitalar foi, ironicamente, oferecida pelo próprio Bolsonaro, que realizou uma live da UTI na véspera, em plena forma, sorteando capacetes de grafeno e instigando seus seguidores. A Corte viu nisso a prova cabal de que o ex-mandatário estava em plenas condições de receber a intimação — e tinha razão.

A partir daí, a cena beirou o surreal. Bolsonaro, ao receber a servidora do Judiciário — cuja única função era colher sua assinatura —, tentou intimidá-la, questionando os detalhes da investigação, exigindo que verbalizasse o nome de Moraes e, ao ser contrariado, explodindo em gritos e acusações paranoicas. Um “chilique”, como muitos classificaram, transmitido pelas redes e amplificado pelos seus aliados mais barulhentos.

Não satisfeito com o espetáculo constrangedor, Bolsonaro ainda acusou a oficial de Justiça de “botar o pé na porta” da UTI — uma alegação digna de quem tenta, a todo custo, inverter os papéis de vítima e responsável. “Assinei depois de 15 minutos”, disse, como se houvesse alguma glória em retardar o cumprimento da lei.

Enquanto isso, seu aliado e pastor midiático Silas Malafaia, que o visitou logo após a intimação, deu continuidade à retórica incendiária, atacando Moraes com ofensas grotescas e incitando ainda mais seus seguidores contra o Judiciário. A UTI, espaço reservado à recuperação médica, virou palco de lives, comícios improvisados e distribuição de ódio.

O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, explicou de forma objetiva que aguardava a recuperação do ex-presidente antes de efetuar a intimação, mas que a live na UTI, bem como a entrevista concedida ao SBT na noite anterior, comprovaram sua plena capacidade de responder aos ritos legais. Diante disso, a visita da oficial foi não apenas legítima, mas necessária — ainda que recebida com gritos, manipulação e encenação.

Bolsonaro transformou sua internação num ato de guerra simbólica contra as instituições. A cada gesto, tenta criar uma farsa de martírio e perseguição, enquanto se esquiva das responsabilidades por ter liderado — ou, no mínimo, permitido — uma tentativa de subversão democrática. O episódio desta semana não é sobre uma citação judicial. É sobre como um ex-presidente tenta minar a Justiça, mesmo com soro na veia e o coração monitorado por máquinas. E, pior: ainda encontra plateia.