Alimentos ultraprocessados prejudicam todos os órgãos, alerta especialista da USP

Epidemiologista Carlos Augusto Monteiro, criador do conceito de 'ultraprocessado', afirma que esse tipo de alimento é o limite para adaptação alimentar

Os alimentos ultraprocessados afetam negativamente todos os órgãos do corpo humano, segundo o epidemiologista e professor da Universidade de São Paulo (USP), Carlos Augusto Monteiro. Em entrevista ao programa Roda Viva nesta segunda-feira (21), Monteiro — responsável por criar o conceito de “ultraprocessado” em 2009 — explicou que esses produtos são tão diferentes do que o organismo reconhece como alimento que acabam causando desequilíbrios em praticamente todos os sistemas do corpo.

“O alimento ultraprocessado é algo tão estranho ao nosso organismo, tão diferente do que o corpo entende como alimento, que todos os nossos órgãos acabam sofrendo de alguma forma. Apesar da grande capacidade humana de se adaptar a diferentes contextos alimentares, o limite para tal adaptação é o ultraprocessado. Seu consumo desarranja praticamente todos os nossos sistemas”, afirmou o especialista.

A origem do conceito

Monteiro começou seus estudos sobre os ultraprocessados em 2007, motivado pelo aumento da obesidade entre os brasileiros. Durante a pesquisa, notou uma contradição: embora o consumo de sal, açúcar e gordura estivesse caindo, os índices de obesidade continuavam a subir. A explicação estava no tipo de alimento consumido: produtos industrializados, como biscoitos recheados, macarrão instantâneo, refrigerantes e pratos congelados, que já trazem essas substâncias embutidas.

Riscos para a saúde física e mental

Além de contribuírem para o aumento da obesidade, os ultraprocessados estão associados a diversas doenças, incluindo transtornos mentais como depressão e Doença de Parkinson. Um estudo recente, publicado pela revista científica The BMJ, revisou 45 pesquisas com dados de quase 10 milhões de pessoas e encontrou ligação entre o consumo desses produtos e mais de 32 doenças diferentes.

Algumas das conclusões do estudo:

Há ainda evidências de:

Situação global e no Brasil

De acordo com a epidemiologista Eurídice Martínez Steele, do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens/USP), a hipótese de que os ultraprocessados estariam por trás da pandemia global de obesidade e doenças crônicas foi lançada em 2009. Desde então, a evidência científica só cresceu.

Nos países de alta renda, a situação é ainda mais grave: nos Estados Unidos, 58% das calorias ingeridas por dia vêm desses produtos; na Austrália, 42%. No Brasil, os números também preocupam: segundo a última Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE, os ultraprocessados já representam 18,4% da alimentação dos brasileiros — em 2002/2003, eram 12,6%.

Ao mesmo tempo, o consumo de alimentos in natura ou minimamente processados caiu cerca de 4%.

Doenças associadas ao consumo de ultraprocessados:

Principais exemplos de alimentos ultraprocessados:

Um alerta para o futuro

Para especialistas como o médico nutrólogo Durval Ribas Filho, o problema está na dose: o consumo frequente e excessivo é o principal responsável pelos prejuízos à saúde. “A questão é a quantidade e a frequência. O consumo exagerado é o que mais preocupa”, explicou ao jornal O Globo.

Diante de tantas evidências, o alerta é claro: reduzir o consumo de ultraprocessados é urgente para preservar a saúde da população.