O biólogo e influenciador Átila Iamarino foi alvo de críticas em seu perfil no Instagram (@oatila), que conta mais de 1 milhão de seguidores, por ter sido contratado pela petroleira Shell como um dos rostos da campanha Caminhos do Amanhã.
Iamarino publicou três posts – o primeiro há três semanas, e o mais recente nesta quarta-feira (17) – nos quais cita de onde vem o petróleo, por que o país tem potencial importância como líder na transição energética e como a empresa britânica atua com expertise e segurança no Brasil, “oferecendo energia vital e ajudando a impulsionar vidas”.
A ação suscitou críticas de diversos setores, especialmente à luz da proximidade da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), prevista para ocorrer em Belém, Pará, em novembro de 2025
A situação em questão levantou debates sobre a relação entre divulgadores científicos e empresas do setor de combustíveis fósseis, particularmente no contexto de eventos internacionais que visam discutir estratégias para mitigar as mudanças climáticas. Críticos argumentam que a associação de figuras públicas da ciência com empresas petrolíferas pode enviar mensagens contraditórias ao público, especialmente quando se espera que a COP30 fortaleça compromissos globais para a redução de emissões de gases de efeito estufa.
É relevante destacar que, em edições anteriores da COP, como a COP28, realizada em 2023, grandes empresas petrolíferas, incluindo a Petrobras, assumiram compromissos para reduzir emissões de metano
Entretanto, a participação de representantes da indústria do petróleo em conferências climáticas continua a ser um tema controverso, suscitando discussões sobre a influência dessas empresas nas políticas ambientais e a efetividade de seus compromissos.
O episódio envolvendo Átila Iamarino evidencia a necessidade de uma reflexão mais profunda sobre o papel dos divulgadores científicos na interface entre ciência, indústria e sociedade, especialmente em tempos em que a comunicação científica desempenha um papel crucial na formação da opinião pública sobre questões ambientais.
A multinacional Shell tem um histórico polêmico em relação às questões ambientais, sendo alvo de duras críticas por sua contribuição para a degradação do meio ambiente.
A Shell é uma das maiores emissoras de gases de efeito estufa do mundo, e suas atividades incluem a exploração e o refino de petróleo e gás natural, setores conhecidos por gerar danos ambientais significativos. Além dos impactos diretos causados por derramamentos de petróleo, desmatamento para exploração de novos campos e a emissão de poluentes atmosféricos, a empresa também é acusada de se opor a políticas ambientais mais rigorosas.
Diversos relatos e investigações apontam que a Shell, assim como outras grandes empresas do setor, financia grupos de lobby que pressionam governos para afrouxar regulamentações ambientais. Esse lobby frequentemente visa desacreditar cientistas e ativistas ambientais, influenciando políticas públicas em detrimento de iniciativas sustentáveis. Em um exemplo recente, documentos vazados revelaram que a Shell pressionou governos europeus e americanos para enfraquecer metas de redução de emissões, ao mesmo tempo em que continuava a investir massivamente em combustíveis fósseis.
Esse comportamento é uma demonstração clara de como o poder econômico de gigantes petrolíferas, como a Shell, pode ser usado para minar esforços globais de combate às mudanças climáticas. Enquanto em suas campanhas publicitárias, essas empresas podem se apresentar como “aliadas” da transição energética, suas ações de bastidores frequentemente revelam uma estratégia mais voltada para garantir a continuidade do status quo, sem grandes mudanças que comprometam seus lucros.
O apoio a figuras públicas como Átila em campanhas de marketing apenas reforça a tentativa dessas empresas de legitimar suas ações e melhorar sua imagem, enquanto a crise climática se agrava. Portanto, é essencial que a sociedade e os divulgadores de ciência estejam atentos às implicações éticas dessas parcerias, especialmente em um momento crítico para a construção de um futuro ambientalmente sustentável.
Vem aí a Conferência de Ação Política Conservadora
Em um cenário político que reflete a crescente polarização em torno das questões climáticas, a Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC) de 2025, anunciada como "o maior evento conservador do mundo", será realizada em Manaus, Amazonas, pouco antes da COP30 no Pará. A escolha da cidade, situada no coração da Amazônia, carrega um simbolismo forte, dada a importância da floresta tropical para o equilíbrio climático global e os debates que permeiam a preservação ambiental.
O CPAC, evento que reúne lideranças políticas, empresariais e influenciadores conservadores de diversas partes do mundo, é conhecido por seu ceticismo em relação às políticas ambientais e às narrativas sobre as mudanças climáticas. Em edições anteriores, foram comuns discursos contrários à regulamentação ambiental mais rígida e ao papel dos órgãos internacionais como a ONU no combate às mudanças climáticas.
Com a conferência sendo realizada em Manaus, teme-se que o evento se torne uma plataforma para grupos conservadores e setores ligados ao agronegócio e à exploração de recursos naturais contestarem as políticas de preservação da Amazônia e reforçarem o discurso de que o desenvolvimento econômico da região deve se sobrepor às questões ambientais. Há receios de que o evento impulsione a defesa de interesses contrários aos objetivos da COP30, que tem como principal foco a promoção de soluções globais para a crise climática, com especial atenção à preservação de biomas como a Amazônia.
A proximidade geográfica e temporal entre o CPAC e a COP30 levanta preocupações sobre o impacto que o evento conservador pode ter nas negociações climáticas internacionais. Enquanto a COP30 em Belém busca fortalecer os compromissos globais para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e preservar os ecossistemas cruciais, o CPAC pode se consolidar como um contraponto ideológico, defendendo políticas que priorizam o crescimento econômico e a exploração de recursos naturais em detrimento da proteção ambiental.
Essa sobreposição de eventos em regiões tão sensíveis para o meio ambiente coloca o Brasil no centro de um debate global sobre o futuro da Amazônia e a luta contra as mudanças climáticas, deixando claro que as decisões políticas e econômicas tomadas nos próximos meses terão repercussões profundas tanto no âmbito nacional quanto internacional.