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O trânsito mata

O trânsito mata

Estudos divulgados em 2010 e 2013 pela Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram que os acidentes de trânsito representam a terceira causa de mortes na faixa de 30-44 anos; segunda na faixa de 5-14 e primeira na faixa de 15-29 anos de idade em todo o mundo. As pesquisas revelam ainda o grave crescimento das mortes relacionadas com acidentes envolvendo motocicletas e também destacam que 90% dessas mortes acontecem em países com rendimentos baixos ou médios que, em conjunto, possuem menos da metade dos veículos do mundo.
Tais dados, talvez, já nem causem tanta estranheza levando em conta a frequência com o que assunto esteja nas manchetes dos meios de comunicação e como foco em muitas conversas informais no dia a dia de cada um de nós. Entretanto, essa crescente violência no trânsito levou as Nações Unidas a proclamar a Década de Ação pela Segurança no Trânsito 2011-2020, procurando, primeiro, estabilizar e, posteriormente, reduzir as cifras de vítimas previstas, mediante a formulação e implementação de planos nacionais, regionais e internacionais.
De acordo com o Mapa da Violência – Acidentes de Trânsito e Motocicletas, os óbitos por acidentes de
trânsito tiveram um rápido crescimento em todo o Brasil na década 2001/2011: o número de vítimas passou de 30.524 para 43.256, o que representa um aumento de 41,7%. No Piauí a situação foi mais grave, saindo da 20ª posição, com uma taxa de 15,3 óbitos por 100 mil habitantes, para a 4ª colocação com 34,7 óbitos por 100 mil habitantes. Em relação aos casos envolvendo motocicletas o Piauí apresentou a maior taxa de mortalidade em todo o País, com 21,4 mortes por 100 mil habitantes.
Para o diretor do Hospital de Urgência de Teresina (HUT), Gilberto Albuquerque, que revela que 90% das cirurgias realizadas no Hospital é de trauma relacionados a acidentes de motos, a situação só será resolvida a partir de uma rigidez maior na fiscalização.
Gilberto ressalta também que o álcool está envolvido em 75% dos casos de acidentes com motocicletas,
assim como o fato da alta velocidade , da falta de capacete , da falta de conhecimento técnico dos condutores, da ausência de habilitação. “São as quatro principais causas, e a intercessão entre eles é muito grande, tem muitos casos em que estão os quatros fatores envolvidos. Para reduzir de imediato só tem uma maneira, fiscalizar o trânsito. A ação educativa é a longo prazo. Estamos com mais de 60 anos tentando ensinar as mães que o leite materno é o melhor alimento para o bebê e ainda não conseguimos , então imagine ter que esperar pelo menos 60 anos para educar os motoristas. Não temos mais como esperar. Só tem uma maneira é intensificar a fiscalização”, reforça.
A gerente de Vigilância e Agravos Não Transmissíveis da Fundação Municipal de Saúde, Ana Amélia Gallas Pedrosa também aponta o álcool e a violência como fatores de risco para o agravamento da situação e acredita que é necessário trabalhar a partir de um tripé fiscalização, infraestrutura das vias e a educação e conscientização da população, incluindo todos, motoristas, ciclistas, motociclistas e pedestres.
Para o chefe da Seção de Policiamento e Fiscalização da Polícia Rodoviária Federal (PRF) do Piauú, inspetor Stanley Keynes “por maior que seja a fiscalização, é preciso que o cidadão (motorista, passageiro e pedestre) também faça a sua parte respeitando a legislação de trânsito e, sobretudo, respeitando o semelhante. Se cada usuário do trânsito der sua parcela de contribuição, não haverá necessidade de uma fiscalização mais rigorosa e nem haverá tantos acidentes, principalmente, com vitimas fatais”.
Acidentes nas rodovias federais no Piauí
A partir da proclamação da Década de Ação pela Segurança no Trânsito 2011-2020 muitos órgãos públicos passaram a fazer diagnósticos e aplicar estratégias para um diminuição da violência no trânsito.
No Piauí os primeiros resultados começam a ser obtidos. Em 2013 foram registrados nas BRs do Piauí 2877 acidentes, no ano passado 2.753 e em 2015 até o momento foram 1860, esta tímida redução não se refletiu no número de óbito. Na comparação entre 2013 e 2014, por exemplo, temos um aumento de 200 para 232 mortes por acidentes de trânsito, índice mais significativo ainda quanto se trata de casos envolvendo motocicletas, em que o número sai de 79 pra 119 óbitos.
Em 2015 foram registrados até o momento 140 óbitos, sendo 58, em acidentes com motociclistas. “Temos incrementado as fiscalizações, sobretudo, nas operações nos feriados, e isso dá um impacto positivo. Todavia, historicamente, os meses de novembro e dezembro se registram um aumento na ocorrência de acidentes e vítimas. Esperamos que este ano isso não ocorra e estamos trabalhando para isso”, destaca o inspetor.
Stanley Keynes explica ainda que desde de 2012, a PRF desenvolve a Operação Rodovia, que começa na 2ª semana de dezembro e se estende até após o carnaval, concentrando ações nos 100 trechos de maior índice de acidentes no Brasil. O Piauí, em 2014, teve dois apontamentos nesta relação, que são os trechos urbanos da BR 343 e 316 em Teresina. “Esse ano a PRF tem focalizado as ações para coibir infrações por alcoolemia, excesso de velocidade, não uso de cinto de segurança e capacete, além das ultrapassagens indevidas, porque essas são as que mais contribuem para a ocorrência de acidentes e agravam o estado de saúde das vítimas”, ressalta.
Custos Os reflexos dos acidentes de trânsito no Sistema Único de Sáude (SUS), assim como para os investimentos sociais são gigantescos. A despesa mensal do HUT, por exemplo, é em torno de R$ 12 milhões e o gasto com pacientes vítimas de acidentes de trânsito, especialmente com motos envolvidas, é entre R$ 6 e R$ 8 milhões , ou seja mais de 50% dos recursos .
O diretor relata que há pacientes que são operados até 17 vezes, “Passam por cirurgias de neurologia, ortopedia, plástica, vascular , entre outras. Eles se quebram muito. Hoje o recurso que gastamos com pacientes vítimas de acidentes com alguma relação com moto, é entre R$ 6 e R$ 8 milhões por mês. Usam materiais caríssimos e passam bem mais tempo no hospital. Nós temos uma média de 20 pacientes por dia que saem do HUT seqüelados, com amputações de membros, perda de memória, doenças neurológicas, perdas de parte da face e cicatrizes”, lamenta.
Diego Dias de Oliveira, 23 anos, mecânico, foi uma dessas vítimas , em que teve motocicleta envolvida. Ao voltar de um festa com a namorada, o rapaz, que não faz ingestão de bebida alcóolica, conduzia a sua moto quando, de repente, já sem tempo para desviar, percebeu uma outra moto com as luzes apagadas e atravessada na pista, o choque foi inevitável, provocando graves consequências. “O cara parou a moto de forma atravessada na pista para pegar um boné e não deu nenhuma sinalização. Haviam três pessoas na moto, com eles não aconteceu nada, já comigo e com minha namorada as lesões foram graves”, lamentou o rapaz, que estava sem capacete e além de muitas escoriações em todo o corpo, teve que passar por uma cirurgia no rim e a sua namorada teve perda de massa encefálica e também passou por cirurgia.
A situação é grave e desperta a preocupação quanto ao investimento em outras áreas sociais e de infraestrutura que poderia ser feito com os recursos que hoje são destinados ao tratamento dos pacientes vítimas de acidentes de trânsito, levando em conta que em muitos casos poderiam ser evitados.
Gilberto Albuquerque faz uma relação de custos e investimentos importantes para o desenvolvimento da cidade. “A Ponte Estaia da, por exemplo, custou R$ 84 milhões, se colocarmos uma média de gasto de pacientes vítimas de acidentes de trânsito de R$ 7 milhões por mês, ou seja, por ano o HUT gasta o equivalente a construção de uma ponte, que é um equipamento urbano bastante necessário em Teresina . E, sendo um a ponte mais simples, como a Wall Ferraz, que custa mais ou menos R$ 30 milhões, daria pra fazer quase três pontes”, compara.

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