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Cortina de fumaça e lacração, podemos e devemos ser melhores do que isso

Cortina de fumaça e lacração, podemos e devemos ser melhores do que isso

Do site Fórum, por Renato Rovai Há uma nova polêmica em curso. Ela diz respeito a se todos os movimentos do governo Bolsonaro que não digam respeito à economia são ou não cortina de fumaça. Com todo o respeito, o debate vem se construindo de forma muito rasa. O que está em jogo no Brasil são as suas riquezas, o patrimônio nacional, os direitos trabalhistas, mas também as terras indígenas, os direitos das mulheres e LGBTs e a formação escolar de milhões de jovens e adolescentes. Entre outras muitas coisas, como o que nos restou de democracia. O governo de Bolsonaro é ultra capitalista. Uma soma de interesses de ruralistas, capital financeiro, milicos e judiciário entreguistas, neo pentecostais pilantras e todo tipo de maluco que só pensa em grana e sucesso. Esse pessoal tem posição diferente aqui e ali, mas concorda no essencial. O essencial é o discurso anti-esquerda com viés anti-corrupção. E que tem como plataforma a defesa da família. É neste campo da guerra cultural que se estabelece o consenso. De Paulo Guedes, passando pelo general Mourão, por Malafaia, Moro ou qualquer filho do Coiso, o consenso é o discurso na linha da ministra Damares. Que por incrível que pareça se tornou a referência ideológica da tropa. E que sustenta até as sandices da política internacional do Ernesto Araújo. Evidentemente que isso não é cortina de fumaça. É muito mais do que isso. Por ser o que unifica, é a cara popular do projeto Bolsonaro. É o que lhe garante militância. É em nome de acabar com Paulo Freire nas escolas que milhares usaram a camisa com Ustra Vive no dia primeiro do ano. Se isso for tratado como algo menor, o erro cometido será imenso. Mas a questão é COMO fazê-lo. O discurso da lacração que impede o diálogo e só aceita a fala de alguns em temas que são estruturantes da sociedade que queremos precisa também ser debatido e questionado. Ele é autoritário e contribuiu para o estreitamento do projeto político progressista. É preciso ouvir a senhora que vai aos cultos todas as quartas e domingos e trabalha como faxineira seis vezes por semana. Sua condição de evangélica não pode ser usada como forma de oprimi-la e silenciá-la por aqueles que se consideram a elite dos oprimidos. As mudanças estruturais que o Brasil precisa fazer para ser uma democracia menos frágil e um país mais justo passam por criar mais direitos para negros e mulheres, por exemplo. Um projeto estruturante de sociedade que não dê prioridade a isso não é progressista e muito menos de esquerda. O que não significa que ele não tenha que ser construído em amplo debate e respeitando a imensa multiplicidade cultural e de valores do povo brasileiro. Não basta construir projetos progressistas. Eles precisam ser populares. Saber dialogar com o sentimento de uma nação é o xis da questão. E neste ponto Bolsonaro foi muito eficiente ao construir um discurso simples que permite destruir todas as nossas conquistas políticas, econômicas e culturais em nome de que “é preciso mudar tudo, talkey?” Se aqueles que estão na linha de tiro não conseguirem entender que não há dicotomia entre ser contra o discurso de Paulo Guedes e de Damares, que os dois são faces da mesma moeda e que um sustenta a viabilização da agenda do outro, estamos lascados. A quantidade de derrotas que lamentamos será ainda maior do que imaginávamos quando o resultado das urnas foi divulgado no dia 28 de outubro.

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