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Cana-de-açucar constrói família e da marca à Teresina

Cana-de-açucar constrói família e da marca à Teresina

Quantas histórias este alimento já contou no Brasil? Várias, com certeza! O PensarPiauí quer contar mais uma história escrita pela mão de gente que trabalhou a cana-de-açucar. “Eu plantei cana, limpei cana, moi, fui banqueiro de engenho, sei fazer rapadura. Da cana, eu sei tudo. É um serviço pesado, cansativo. Já trabalhei com armarinho, caminhão, hotel, mas só largo a cana, um dia quando ela não mais existir (sorrindo) ou eu morrer.” Este foi um depoimento dado por Raimundo de Sousa Barros – proprietário de lanchonetes que tem como especialidade a venda do pastel com caldo de cana, no centro de Teresina. Este lanche começou a ser difundido no início dos anos 80, desbancando a abacatada que, até então, era a merenda preferida dos teresinenses. Lá se vão mais de 30 anos e não é demais afirmar que o lanche de pastel com o caldo de cana, hoje, é a cara de Teresina. Como tudo isso começou? Para fazer justiça com a história, Raimundo afirma que ao abrir sua primeira pastelaria especializada no caldo de cana e pastel, já havia uma outra a “Kiko”, do Antônio, ao lado da Pintos Magazine. “Ele ficou pouco tempo no ramo, menos de um ano talvez. Deve ter desistido porque é muito cansativo, é uma luta muito pesada. Ai, depois de mim, vieram várias” – diz Raimundo. Ele é natural da Bocaina. Quando jovem foi tentar a vida em São Paulo. Sempre preocupado com a família, um dia indagou seu pai sobre as 2 irmãs jovens e a vontade que tinha de vê-las estudando. Sugeriu que o pai as mandasse a Picos. Seu pai respondeu negativamente dando as justificativas: “Filha minha não boto em pensão, só sai de minha casa, se for para a de um irmão, e, no Piauí. São Paulo, não!” Com esta determinação do pai e já pensando em vir para o Piauí, Raimundo deixa São Paulo e fixa moradia em Teresina. Em 1977, então, Raimundo inicia sua vida na capital do Piauí. No prédio do cine Rex, na Praça Pedro II, abre uma pequena lanchonete, a “Kikafé”, que vendia sucos, refrigerantes e salgados. Algum tempo depois fechou aquele comércio e foi trabalhar produzindo salgados e revendendo-os aos donos de lanchonetes da época, chamando o empreendimento de “fábrica de salgados”. “Com um certo tempo, a concorrência apareceu vendendo o salgado bem mais barato e a minha clientela começou a me abandonar. Foi ai que eu tive a ideia de botar a pastelaria. Já que não queriam comprar meus produtos teriam, então, que concorrer com eles, porque eu abriria a pastelaria e venderia os salgados produzidos por mim mesmo” –sentenciou Raimundo.
Os alunos dos colégios do centro de Teresina, naquela época, era os grandes fregueses do caldo de cana. Merenda boa, refrescante, forte e barata, própria para a vida do estudante. Muitos profissionais da Teresina de hoje, em seu tempo de escola, passaram a pastel e caldo cana. Raimundo nunca foi de ter medo de concorrência. Além de abrir suas próprias lanchonetes incentivou familiares e amigos que queriam empreender. Funcionando como consultor, assessorou um cem número deles e hoje quase todas as lanchonetes de Teresina, tem alguma marca do Raimundo. Ele afirma que dá para viver muito bem só de caldo de cana. “Tenho casa para morar, tenho outras casas, tenho carro bom, sobra mais alguma coisa. Vou reclamar de que? Preciso apenas reconhecer que foi a cana que me deu tudo que tenho” - diz ele.
Tempos remotos O sangue de comerciante sempre correu nas veias do Raimundo. Ainda jovem na Malhada - comunidade rural de Bocaina – era ele quem comercializava o algodão, um dos produtos da lavra da família. Quase todas as semanas estava em Picos vendendo aquele que foi chamado de ouro branco. Foram as atividades da roça que botaram Raimundo num primeiro contato com a cana de açúcar. Nos idos dos anos 60, os engenhos eram comuns nas comunidades rurais do Piaui. Engenho , é o nome dado a uma unidade especializada na transformação da cana em derivados como o melaço, a garapa, a rapadura, etc. O engenho é de um plantador de cana que poderá aceitar ou não processar a cana-de-açúcar de terceiros. João Manoel – pai do Raimundo – não tinha engenho. Mas a Malhada estava repleta deles. Os engenhos eram movidos pela força de bois, sendo os cilindros construídos com madeira. Raimundo inicia seus contatos com a cana nos engenhos dos tios “seu Dé”, Clementino e de Francisco, da “velha Rosa”. Na Malhada, o pai do Raimundo plantava cana para a produção da rapadura. Rapadura é um doce em forma de pequenos tijolos, com sabor e composição semelhantes ao açúcar mascavo. Ela surgiu como solução para transporte de açúcar em pequenas quantidades para uso individual. Como o açúcar granulado umedecia e melava facilmente, os tijolos de rapadura eram acomodados em sacolas de viajantes, resistindo durante meses a mudanças atmosféricas.
A rapadura é considerado um alimento com maior valor nutritivo que o açúcar refinado pois, enquanto este é quase exclusivamente sacarose a rapadura possui outras substâncias nutritivas em sua composição. O nome rapadura, originou-se da raspagem das camadas espessas de açúcar presas às paredes dos tachos utilizados para a fabricação do mesmo
Processo de fabricação Após o corte da cana-de-açúcar, esta é transportada até o engenho onde deverá ser moída. O caldo de cana resultante da moagem é levado para a decantação, com o intuito de separar as impurezas. A concentração até se atingir o ponto para o batimento se dá por meio da fervura do caldo em até cinco tachos. Depois que o caldo se torna melado ele é batido para obter uma maior consistência e ser colocado em formas no formato tradicional de paralelepípedo. Depois que a rapadura já endureceu, esfriou e ganhou a sua forma, pode ser retirada das formas. No nordeste brasileiro foi muito utilizada pelo sertanejo, junto com a farinha, para ser consumida no local de trabalho. A rapadura é famosa pelo seu alto valor calórico, sendo rica também em vitaminas, minerais e proteínas.
A cana do Raimundo
e do teresinense Nos dias de hoje a cana é a principal matéria-prima para a fabricação em larga escala do açúcar e álcool (etanol). No passado foi importante aliada da agricultura de subsistência no nordeste brasileiro. Hoje, também, através de seu caldo, alivia as fortes temperaturas das cidades nordestinas – entre elas, Teresina. No Brasil, a cana-de-açúcar foi introduzida no início dos anos 1500. Então, o PensarPiauí conclui com uma poesia encontrada na internet.
CANA DE AÇÚCAR, VIDA Sol a pino, Curvo-me diante de ti, Cana esguia ou caiada, principesca! Te pego dourada.
Filha da terra... Áspera pele, minhas mãos sangram Decepo-a, dilacero-a, descubro-a Mordo-a toda! Inteira! Nó a nó ...Tu és doce, doçura...
Vida.
Gostosa!
Cíntia Thomé

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